Comentários
do Blog: Comentário do Blog: Olá amigos leitores, assinantes /
subscritores da Newsletter (serviço gratuito), “leitores ilustres” aí do canto
direito do Blog, seguidores do nosso Twitter oficial (@D_Trabalhista), pessoas
que acionam o botão “curtir” também aí no canto direito e parceiros.
Abrindo pequeno parêntese, este Blogueiro gostaria
de agradecer as diversas manifestações de carinho e de sugestões quanto à nova
Seção de Vídeos. A postagem de áudio e vídeo acerca da nova Lei do Aviso Prévio
e recentes controvérsias bateu todos os recordes do Blog, e, em menos de 02
dias foi objeto de mais de 500 acessos, o que elevou a “audiência” do Diário de
Um Advogado Trabalhista em mais de 30%. Já foram mais de 3.000 visitantes
únicos desde sexta-feira passada quando postamos o vídeo. Grato!
Hoje o Blog volta a publicar na Seção “Advocacia
Trabalhista”, na qual este Blogueiro divide algumas reflexões sobre a evolução das
relações trabalhistas e comenta algumas decisões dos nossos Tribunais
Trabalhistas.
O ponto de partida da reflexão de hoje é um julgamento de Turma do TRT
da 4ª Região – Rio Grande do Sul. Como o leitor verá na notícia de julgamento
ao final transcrita, entenderam por bem os desembargadores da Turma que existem
elementos de subordinação diferenciados para o trabalhador em domicílio,
diga-se de passagem, decisão que reflete uma casuística clássica para a
jurisprudência trabalhista: costureiras ou produtores externos x indústrias de
confecções ou manufaturas.
No caso submetido a julgamento no TRT Gaúcho, a Turma constatou o
ensinamento doutrinário e científico acerca da fragilidade do que seria então
principal elemento caracterizador do vínculo empregatício, que é a subordinação.
A visualização da subordinação somente é possível por olhares sensíveis,
utilizando uma lupa investigativa diferente dos métodos tradicionais. Isto
porque, no contrato de trabalhado a domicílio é importante que o hermeneuta perceba
que a fiscalização é exercida indiretamente, ou seja, não no momento da execução do trabalho, mas sim no momento da sua
entrega, quandoo empregador verifica suas condições. Soma-se a isso, que
o empregador dá ordens de serviço ao trabalhador a domicílio, sobre o modo pela
qual a tarefa deve ser feita, qual o material a ser empregado, etc..
A decisão abaixo também é didática e vale ser lida, à medida que
evidencia traços dos ensinamentos de Manoel Alonso Olea e sua consagrada figura
do “trabalho por conta alheia”, bem como deixa implícito o pensamento de
Maurício Godinho Delgado acerca da sua teoria da “subordinação estrutural ou
retilínea”.
Certo é, e que seja bem dito, que só se descaracteriza a relação
empregatícia para estes tipos de trabalhadores, o fato de vir a pessoa indicada
a contratar terceiros para ajuda-la ou fazer serviço em seu lugar, uma vez que,
aí sim estaria ausente a característica essencial do contrato de emprego: a
pessoalidade.
E apesar disto, porém, não raro encontramos na doutrina e na
jurisprudência trabalhista vozes que admitem que os empregados podem ser
auxiliados nas tarefas por pessoa da família que viva na mesma residência e
seja dependente do trabalhador, conforme autoriza o §3º do artigo 8º do
Decreto-lei 399/38.
Veja agora, a ementa e o voto da decisão que foi objeto da postagem de
hoje:
Acórdão
do processo 0141500-40.2009.5.04.0022 (RO)
Redator:
JOSÉ CESÁRIO FIGUEIREDO TEIXEIRA
Participam:
MARIA INÊS CUNHA DORNELLES, MARIA CRISTINA SCHAAN FERREIRA
Data:
23/03/2011 Origem: 22ª Vara do Trabalho de Porto Alegre
EMENTA:
VÍNCULO JURÍDICO DE EMPREGO. TRABALHO A DOMICÍLIO. O artigo 6º da CLT ampara o trabalhador
doméstico à comparação ao empregado que desenvolva atividades no interior da
empresa. Caso em que a subordinação deve ser compreendida de forma elastecida,
considerando-se a particularidade da situação. Vínculo jurídico de emprego
reconhecido. Recurso Provido.
VISTOS e relatados estes autos de RECURSO
ORDINÁRIO interposto de sentença proferida pelo MM. Juiz da 22ª Vara do
Trabalho de Porto Alegre, sendo recorrente LIRA DA SILVEIRA e recorrido ACL
PRODUTOS PLÁSTICOS LTDA.
(.......)
II-
MÉRITO
1.
VÍNCULO JURÍDICO DE EMPREGO - TRABALHO A DOMICÍLIO
Inconforma-se
a reclamante com o indeferimento de sua pretensão ao reconhecimento do vínculo
jurídico de emprego em decorrência do trabalho a domicílio. Alega que desde
03-4-1995 emprega sua força de trabalho na confecção de bolsas para a
reclamada, costurando-as em seu domicílio. Aduz que a prova testemunhal
produzida nos autos revela que estão presentes os requisitos legais para o
reconhecimento do vínculo jurídico de emprego.
Examina-se.
Data
venia, o entendimento adotado pelo Juízo de origem não deve ser mantido. Isso
porque, tratando-se de trabalho a domicílio, a questão da subordinação não pode
ser tomada nos moldes defendidos na sentença.
É
inequívoco que a reclamante era costureira e que teve sua mão de obra tomada
pela reclamada, assim como é incontroverso que a execução do trabalho ocorria
no âmbito da residência da autora. Portanto é necessário esclarecer que o
elemento subordinação, condicionante do reconhecimento do vínculo jurídico de
emprego, deve ser definido de uma forma um pouco diferente da que se toma
quando o trabalho é realizado nas dependências da empresa. É que o trabalho a domicílio representa
uma descentralização da realização das atividades fins do empreendimento e, por
suas próprias características, importa flexibilização na fiscalização direta da
execução do trabalho.
Não
se pode exigir que a subordinação, enquanto elemento caracterizador da relação
de trabalho, não pode ser tomada de forma rígida em tal situação; não se pode
cobrar do trabalhador a domicílio que cumpra determinada jornada de trabalho;
nem se verificar absolutamente o cumprimento de ordens superiores quanto à
organização do trabalho, ou outros consectários tradicionais do instituto.
Manoel
Alonso Olea, dá importante lição quanto ao critério da dependência como
elemento inerente à relação jurídica de emprego nos seguintes termos:
“Embora seja necessário
a este tema mais adiante, convém, desde logo antecipar sobre ele uma referência:
mesmo que se suponha o contrato se celebre livremente e haja liberdade quanto à
fixação da remuneração, a relação de trabalho para terceiros implica numa
situação jurídica de dependência do trabalhador relativamente ao empresário.
Esta dependência é característica essencial do contrato de trabalho e a espécie
de trabalho que chamamos, em consequência de “dependente”, é que constitui o
objeto do Direito do Trabalho.
A propósito, deve ser
dito, desde logo - a despeito da expressão “dependências” ser imprópria, posto
que sugere uma série de idéias com as quais na realidade não se corresponde,
deixando de sugerir outras que são necessárias para caracterizá-la - que a
dependência é uma consequência ou um efeito da prestação de trabalho para
terceiros, pertencem originariamente a pessoa distinta da que efetivamente
trabalha, esta se reserva um poder de direção, ou de controle sobre os
resultados, os bens que devam ser produzidos, além de determinar como, quando e
onde devam tais bens serem produzidos. No caso, hoje comum, de bens ou
resultados complexos, provenientes de um trabalho conjunto, o poder de
coordenar a produção de cada trabalhador com a dos demais é, também, poder
reservado ao empresário. Fica, destarte, bem claro que a dependência é
inconcebível sem a prestação de trabalho para terceiros (a proposição contrária
não seria verdadeira) e que, em consequência, o ponto básico a ser destacado na
realidade social, quer na sua estruturação jurídica, quer sob o ponto de vista doutrinário,
reside, não na dependência, mas no desvio da atividade para terceiros.
De resto, a submissão a
ordens é muito relativa em numerosos contratos de trabalho e, em alguns casos,
quase inexistente, aparecendo mais como uma potencialidade que só atua em
momentos críticos, não tendo, por isso mesmo expressão objetiva. Na
eventualidade de via a concretizar-se, romperia até com a sequência natural do
trabalho e seu normal desenvolvimento. Em vista disso, a tendência hoje
observada é conceber a dependência como um mero “estado”, dentro de um quadro
orgânico de funções e de competência, dentro de um “círculo rector” ou de uma
“esfera organizativa”, ligando-se ao trabalho prestado a organizações, de que
se falará em seguida.
Ademais, insistir sobre
a dependência - especialmente sobre uma noção anacrônica da mesma - é
extremamente perturbador e traz, como consequência, uma exclusão, ou uma
inclusão apenas parcial ou por extensão, no Direito do Trabalho, de atividades
tipicamente prestadas a terceiros, como é o caso do trabalho a domicílio, que
foi uma das primeiras manifestações históricas do trabalho por conta alheia.
Seria de perguntar-se se a discussão, nesta altura, não está se tornando por
demais bizantina”.
(In: Introdução ao Direito do Trabalho. Tradução de C.A. Barata da Silva. Porto
Alegre: Editora Sulina, 1969. p. 31-3)
Da mesma forma, a respeito ainda da
subordinação, Alice Monteiro de Barros, jurista nacionalmente reconhecida
elucida que:
“A subordinação
jurídica do trabalhador a domicílio não é substancialmente diversa da
subordinação do empregador que exerce suas atividades no interior da empresa.
Em ambas as situações, a subordinação tem como substrato a livre manifestação
volitiva das partes, isto é, tem base contratual, sendo, portanto, compatível
com os princípios da igualdade e da liberdade. A subordinação constitui,
portanto, uma situação jurídica que possui graus diversos, apresentando-se
menos intensa no trabalho a domicílio, que se desenvolve longe dos olhos do
empregador. No trabalho a domicílio, descentraliza-se o processo produtivo, uma
vez que o objeto da prestação do trabalhador vem em destaque não como
resultado, mas como energia laborativa utilizada em função complementar e
substitutiva do trabalho executado no interior da empresa. Em consequência, o
vínculo de subordinação consiste na inserção da atividade do prestador no ciclo
produtivo empresarial e na observância a ordens preventivas e sucessivas.
Ainda que operando
externamente e com seus próprios meios e instrumentos de trabalho, o
trabalhador torna-se elemento integrativo”. (In: Curso de Direito do Trabalho. 5
ed. São Paulo: LTR Editora, 2009. p. 322-3) [grifo nosso]
Os
elementos caracterizadores da relação de emprego restaram comprovados pela
prova colhida, pois a reclamante trabalhava de forma habitual para a reclamada
mediante remuneração. Esclareça-se que o fato - não comprovado - de a
reclamante ter eventualmente prestado serviços para outras empresas não tem o
poder de descaracterizar o vínculo jurídico de emprego com a reclamada,
especialmente porque a exclusividade não é um dos requisitos legais dos artigos
2º e 3º da CLT.
Considerando-se
que o objeto social da reclamada (fl.15) é a produção de artefatos de plástico,
tais como bolsas, sacolas, estojos, dentre outros e que restou comprovado serem
estes os produtos manufaturados pela reclamante, conclui-se que a autora
dedicava sua força de trabalho diretamente na consecução dos fins sociais da
empresa, razão pela qual se reconhece o vínculo jurídico de emprego havido
entre as partes.
Diga-se,
ainda, que o suporte legal que sustenta o reconhecimento do vínculo jurídico de
emprego em tais situações é o artigo 6º da CLT, pois não distingue o empregado
que empresta sua força de trabalho nas dependências do empregador daquele que o
faz em seu domicílio.
Resta
estabelecer o período da vigência do pacto laboral.
A reclamante afirma que trabalhou para
reclamada de 03-4-1995 até 10-12-2007, enquanto a reclamada afirma ter mantido
contrato comercial com a autora entre janeiro de 2004 a junho de 2007.
Não
foram produzidas provas documentais capazes de esclarecer o fato.
Entretanto
foi colhida prova oral emprestada dos autos da reclamatória trabalhista
00935-2009-022-04-00-8 (fls.76-81).
A
primeira testemunha ouvida a convite do reclamante afirmou que em 1994 passou a
residir próximo a casa da reclamante, quando começou a prestar-lhe favores ao
transportar as bolsas costuradas pela autora em benefício da reclamada. Afirmou
que fez isso até 2007 quando mudou de residência. Informou que via a camionete
da reclamada em frente a casa da reclamante carregando lotes de bolsas (de 200
a 500 unidades). Disse, ainda, que quando fazia o transporte de bolsas a
destinatária era a reclamada.
A
segunda testemunha ouvida por indicação da reclamante, Vera Melo, empregada da
reclamada, afirmou que a autora entregava produtos por ela confeccionados em
casa; que na sede da empresa reclamada somente trabalhavam dois costureiros, os
quais faziam as amostras e que essa situação ocorreu desde sua contratação, em
2003.
A
terceira testemunha ouvida por indicação da autora, Suzana, afirmou que trabalhou
na casa da reclamante desde 1996 até 2006, pois cuidava da sogra dela. Disse
que a reclamante trabalhava costurando bolsas para a reclamada desde aquela
época, pois presenciava as atividades e até ajudava a desvirar as bolsas.
De
outro lado, a primeira testemunha ouvida a convite da reclamada, Helena Machado,
disse que trabalhava para a empresa desde março de 1994. Afirmou que a
reclamada tinha por costume contratar mão de obra terceirizada e que, a partir
de 2003 trabalhava no corte e costumava visitar a reclamante para passar
orientações.
Por
fim, a segunda testemunha de defesa apenas confirma a prestação de serviços
pela reclamante a partir de 2002, época em que também realizou a atividade de
costureira em prol da reclamada.
Em
que pese a primeira testemunha de defesa ter afirmado que somente a partir de
2003 sabe que a reclamante passou a prestar serviços como costureira
terceirizada, em seu depoimento fica claro que a reclamada tinha por costume a
contratação de serviços de costureiras. Ou seja, seu depoimento não se presta
para afastar a afirmação que desde 1995 a reclamante era uma das costureiras
“terceirizadas” contratadas pela reclamada, pois a depoente não nega que isso
possa ter ocorrido.
Por
outro lado, as testemunhas da autora confirmam que há muito ela trabalhava para
a reclamada como trabalhadora a domicílio. Duas delas efetivamente presenciaram
a realização do trabalho desde a década de 90 dentro das condições admitidas
pela própria reclamada.
Assim,
não podendo o Direito do Trabalho dar às costas para a realidade que atinge os
trabalhadores a domicílio, entende-se que a autora logrou êxito em demonstrar
que a data inicial do vínculo jurídico de emprego é aquela informada pela
petição inicial, qual seja 03-4-1995 e teve fim em 10-12-2007, desincumbindo-se
do ônus da prova que lhe competia, nos moldes dos artigos 333, I, do CPC e 818
da CLT.
Dá-se provimento ao recurso da reclamante para
reconhecer o vínculo jurídico de emprego de 03-4-1995 a 10-12-2007, devendo a
reclamada proceder às anotações respectivas na CTPS da trabalhadora.
(...)
Ante
o exposto,
ACORDAM
os Magistrados integrantes da 6ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª
Região:
preliminarmente,
por unanimidade de votos, determinar a reautuação do feito para que conste como
recorrente apenas a reclamante. No mérito, por unanimidade de votos, dar
provimento parcial para reconhecer o vínculo jurídico de emprego entre as
partes durante o período de 03-4-1995 e 10-12-2007 e para extinguir o feito sem
resolução do mérito quanto ao pedido de declaração da responsabilidade da
reclamada por contribuições previdenciárias, pronunciando-se a incompetência
material desta Especializada. Custas revertidas à reclamada.
Intimem-se.
Porto Alegre, 23 de
março de 2011 (quarta-feira).
JUIZ CONVOCADO JOSÉ
CESÁRIO FIGUEIREDO TEIXEIRA
Relator
Veja também, outras
decisões comentadas por nós, e que guardam relação com o tema tratado hoje:
Nenhum comentário:
Postar um comentário