Nesta postagem o Diário de Um Advogado Trabalhista
comenta uma recente decisão no âmbito do TRT da 2ª Região e que de certa forma tutela
direitos de segurança e saúde do trabalho para toda a coletividade de
empregados do Banco Itaú.
É uma decisão sem precedentes em uma
ação coletiva de autoria do Ministério Público do Trabalho, e, por este motivo
sugiro ao leitor que se esforce para ler toda a sentença – que é muito extensa,
pois de certo muito enriquecedora, tanto do ponto de vista processual em ações
coletivas, quanto do ponto de vista das vestes constitucionais que abrigam esse
tema que é tão sensível no Direito do Trabalho.
Quem milita ou opera junto à Justiça
do Trabalho em algum momento pode perceber que o trabalho desempenhado pela
categoria profissional dos bancários é penoso, tanto do ponto de vista físico
(quantidade de tarefas e movimentos realizados) como também pelo espectro
psicológico, eis que o alcance de metas e resultados financeiros é o principal
objeto desta atividade empresarial.
No julgamento que poderá ser adiante
lido detalhadamente, o amigo leitor poderá se aprofundar na realidade vivida
pela categoria dos bancários, que enfrentam dificuldades desde aquelas
consideradas físicas do ponto de vista da ergonomia, como outras mais graves,
como desenvolvimento de lesões permanentes (LER/DORT) decorrentes de esforço
repetitivo, passando ainda, por questões discriminatórias após a alta médica,
inclusive por dispensas arbitrárias.
Não traz surpresa, também, a constatação
de ampla prática de assédio moral, como o leitor amigo verá o julgado em
destaque.
Repare, caro amigo blogonauta, que o
Juiz prolator da sentença lastreou seu convencimento com base em inquéritos
civis, laudos, pesquisas, mapas e decisões anteriores, todos colhidos ao longo
de duas décadas.
Que seja dito, e repetido por
questões de justeza, que os estudos mencionados apontam para uma conduta que
cada vez mais é vigilante e atenta por parte do Banco Itaú em relação à saúde e
segurança dos empregados que lhe estão custodiados, embora esteja muito aquém
da proteção mínima.
Outro aspecto importante e, que
milita na Justiça do Trabalho sabe muito bem disso: nesta sentença, apenas ao
acaso trata-se de uma investigação feita no Banco Itaú, mais esta realidade é
vivida em qualquer outra concorrente. Poderia ser, sem qualquer esforço, uma
mera amostragem da realidade vivida por toda a categoria dos bancários. Já vi
realidades piores em certas agências distantes dos principais centros urbanos.
Em breve síntese, foi decidido que o
Banco deve:
*deve cumprir integralmente a NR-17 do Ministério do Trabalho, que trata de ergonomia;
*realizar um levantamento ergonômico em todos os postos de trabalho abordando aspectos relacionados à NR-17,especialmente em relação ao mobiliário e equipamentos;
*estabelecer pausas de 10 minutos a cada 50 de trabalho (sem descontar do salário) para as atividades de entrada de dados;
*respeitar o retorno gradativo ao
trabalho, quando o empregado ficar mais de 15 dias afastado por motivo de
LER/DORT, salvo recomendação médica em contrário;
*emitir CAT para os empregados com suspeitas de LER/DORT, mediante a apresentação de exames médicos dos empregados;
*elaborar PCMSO com descrição detalhada dos riscos de cada função, com a periodicidade dos exames médicos, com as ações que deverão ser tomadas para amenizar os riscos, estatísticas de resultados de exames anormais e o planejamento para o próximo ano;
*em especial para os empregados do BANKFONE e os CAIXAS o banco deve realizar exame periódico anual;
*abster-se de rescindir o contrato de trabalho dos empregados acometidos por LER/DORT e que se encontrem em tratamento de saúde, gozo e auxílio doenças ou reabilitação profissional;
*não submeter seus empregados com suspeitas destas doenças a procedimentos vexatórios ou discriminatórios: inserção em local isolado, obrigação de inação (não dar tarefas para executar), divulgação de dados médicos sigilosos e realização de transferências sucessivas.
►Questões
Processuais Relevantes
Trata-se de uma sentença de primeira
instância, publicada aos 05/08/2013 e passível de recurso;
Referida sentença, por ser proferida
em sede de ação coletiva, protege todos os empregados do Itaú que laboram no
Estado de São Paulo;
Concedeu a tutela antecipada para todas as medidas que acima destaquei, a partir da data da publicação da sentença, que ocorreu no dia 05/08/2013, fixando ainda, prazo máximo de 180 dias para que sejam implementadas integralmente;
Sugiro, ainda, que o leitor leigo,
leia com atenção o tópico “Impugnação de Documentos” – onde se questiona a
investigação preparada pelo Ministério Público. A recente PEC nº 37 pretendia
suprimir este tipo de atividade investigatória, e entenderá porque foi
amplamente rechaçada pelas vozes das ruas.
Aos amigos estudantes, advogados e
demais operadores do direito do trabalho, sugiro lerem os tópicos processuais
descritos como “Limites territoriais da lide” e “Legitimidade ativa do
Ministério Público”. São campos
férteis para aprenderem o arcabouço processual (LACP, CDC, CPC, CF/88) que rege
a prática da Ação Civil Pública.
Eis,
enfim, para uma análise mais detida do leitor, a íntegra do julgado sob análise
nesta Postagem:
44ª Vara do Trabalho de São Paulo - Proc. 00665-61.2005.5.02.0044
TERMO
DE AUDIÊNCIA
Em
19 de julho de 2013, às 17h00, na sala de audiências da 44ª Vara do Trabalho de
São Paulo - SP, sob ordem do Juiz do Trabalho, RICARDO MOTOMURA, foi submetido
o processo a julgamento, sendo proferida a seguinte:
S
E N T E N Ç A
I
– RELATÓRIO
O
MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO DA 2ª REGIÃO ajuizou a presente ação civil pública
em face de BANCO ITAÚ S/A, postulando, de acordo com as notícias fáticas e de
direito aduzidas na peça de ingresso, em suma, a condenação da ré nas
obrigações de implementar PCMSO e emitir análise profissiográfica condizente
com a realidade dos cargos vigentes nos seus estabelecimentos, cumprir as normas
regulamentares de medicina e segurança do trabalho, comunicar ao INSS as
suspeitas de doença ocupacional, propiciar adequada reabilitação profissional
aos seus empregados, não exigir horas extras fora das hipóteses legais, não
rescindir os contratos de trabalho dos acometidos de LER/DORT, não discriminar
nem assediar moralmente os acometidos de doença ocupacional, além de pagar uma indenização
por dano moral coletivo e multa diária pelo descumprimento das obrigações
impostas, estas a serem revertidas a FAT. Requereu a antecipação dos efeitos da
tutela e juntou documentos, que foram autuados em 37 volumes apartados.
Às
fls. 90 foi indeferido o pedido de tutela antecipada.
A
ré compareceu à audiência (fls. 102), oportunidade em que apresentou
contestação onde requereu a riscadura das expressões injuriosas aventadas na
inicial, impugnou os documentos trazidos com a vestibular e suscitou
preliminares de ilegitimidade de parte e impossibilidade jurídica de pedido,
além de postular a limitação dos efeitos da coisa julgada ao município de São
Paulo. No mérito, aduziu
cumprir
de modo escorreito as normas trabalhistas, não exigir horas extras fora dos
casos legais ou mesmo praticar assédio de qualquer gênero aos seus empregados,
pugnando pela improcedência dos pleitos iniciais. Também juntou documentos, que
formaram o 38º volume apartado.
O
Ministério Público do Trabalho manifestou-se quanto à defesa, em réplica de
fls. 152/177. Após, foi designada prova pericial para averiguar as condições de
trabalho havida na ré (fls. 180 e 215), sendo definidos parâmetros gerais para
a diligência às fls. 250, 319, 328 e 1575/1576. A perícia foi realizada pela
FUNDACENTRO, sendo o laudo apresentado em duas encadernações, sendo o vol. I
relativo à ergonomia e organização do trabalho e o vol. II referente às discriminações
e assédio moral supostamente praticados pela ré. Os laudos foram juntados no
39º volume apartado (vide fls. 1.226).
Às
fls. 1352, a ré comunicou a alteração de sua denominação, requerendo a
alteração do pólo passivo para ITAÚ UNIBANCO S/A, o que foi deferido.
As
partes se manifestaram quanto à prova pericial, apresentando impugnações e
pareceres de seus respectivos assistentes técnicos. As manifestações do autor
foram juntadas às fls. 356/412 e 1318/1328; as da ré às fls. 1235/1251,
1254/1280, 1513/1540, 1541/1562 e 1620/1641.
A
FUNDACENTRO prestou esclarecimentos às fls. 1361/1406 e 1586/1611, respondendo
aos quesitos das partes e do Juízo.
Por
ocasião do despacho de fls. 1650 foi encerrada a instrução processual. Razões
finais escritas pela ré (fls. 1652/1667) e pelo Parquet (fls.
1672/1690). Julgamento marcado para esta data (fls. 1694). Partes inconciliadas.
Passo a decidir.
II
– FUNDAMENTAÇÃO
1. Encerramento da instrução processual. Em razões finais, a ré
impugnou o encerramento da instrução processual, requerendo a designação de
audiência para oitiva do Parquet, testemunhas, assistentes técnicos e
peritos. No entanto, os autos já
contam
com elementos probatórios consistentes, sendo completamente dispensável a
realização de novas diligências. Com efeito, a vasta documentação trazida pelas
partes e a prova pericial produzida nestes autos já abrangem, por si só, toda a
matéria debatida. E, tratando-se de prova técnica já perfeita e acabada, resta
inútil a oitiva dos peritos ou assistentes técnicos como testemunha (art. 400
do CPC), ou mesmo o depoimento pessoal do representante do MPT, que figura como
substituto processual nestes autos, sem poderes para transigir ou capacidade
para confessar.
Demais
disso, observo que já constam, nas atas de audiência e sentenças judiciais
copiadas às fls. 1140/1223 e 1564/1567, dentre outros documentos, relatos
testemunhais suficientes à apreciação do feito. Tais documentos, que
consubstanciam julgados variados sobre o meio ambiente de trabalho do Banco
Itaú, revelam-se plenamente aproveitáveis no caso vertente, visto que as provas
respectivas foram produzidas com a devida observância do contraditório. Logo,
havendo lastro probatório suficiente, indefiro o requerimento de reabertura da instrução
processual.
2. Nulidade da perícia. A ré se insurge, ainda,
contra a perícia judicial e laudos de fls. 1226, 1361/1406 e 1586/1611,
alegando a parcialidade da FUNDACENTRO, a limitação da diligência realizada ante
a pequena quantidade de agências vistoriadas, e a ausência de resposta a todos
os quesitos formulados.
Sem
razão a ré. Primeiro, porque a FUNDACENTRO representa uma fundação autárquica
filiada ao Ministério do Trabalho e Emprego – MTE, e, consequentemente, é
totalmente desinteressada no resultado do feito. Além disso, constitui pessoa
jurídica especializada na matéria posta em Juízo, sendo representada nestes
autos por uma equipe multidisciplinar de notável conhecimento técnico em
medicina e segurança do trabalho, composta por uma química e mestre em engenharia
(Dra. Cristiane Barbeiro Lima), uma psicóloga (Dra. Renata Mendes) e dois
médicos do trabalho (Dr. Cesar Pata e Dra. Cristiane Barbosa).
No
que tange à abrangência da perícia, verifico que a própria ré relatou haver
padronização em seus estabelecimentos, com “similaridade dos postos de
trabalho” (vide fls. 766 do volume IV de documentos apartados), o que foi
confirmado por seu assistente técnico também nestes autos (fls. 1261 e 1265), inclusive
mencionando que “as atividades laborais desenvolvidas em todas as agências
da empresa ré são mais que similares, são idênticas” (fls. 1530). Assim
sendo, mostra-se plenamente cabível o cumprimento da diligência por amostragem,
tal qual realizado pela FUNDACENTRO, inclusive em respeito aos princípios da
utilidade dos atos processuais e da duração razoável do processo, posto que o
deferimento dos requerimentos patronais implicaria a inequívoca perpetuação da
lide.
Destarte,
dispensável a inspeção de outras agências ou estabelecimentos, não havendo se
falar em complementação do laudo. Os quesitos relevantes foram todos
respondidos, inexistindo obrigatoriedade de o expert responder aos
infindáveis questionamentos e impugnações das partes, mormente quando estes não
se mostram imprescindíveis ao deslinde do feito. No mais, é indiferente o fato
de a FUNDACENTRO ou os assistentes técnicos terem se pronunciado pela procedência
ou improcedência dos pedidos, dado que a análise das provas cabe ao magistrado,
não aos peritos ou às partes. Não há nulidade, neste aspecto, a ser declarada.
Afasto.
3. Impugnação aos documentos. Os documentos trazidos com
a vestibular retratam as averiguações promovidas pelo Ministério Público em
instituições bancárias de diversas regiões do Brasil, sendo o Banco Itaú
investigado por vários anos na via administrativa, consoante se infere da
certidão de fls. 1691/1693 (mapa de provas). As informações foram colhidas pela
parte autora através dos PP n.º 905/2000 e 3604/2002, procedimentos
preparatórios extrajudiciais e facultativos cujo escopo foi o de viabilizar o
exercício responsável da presente ação civil pública.
Os
procedimentos acima descritos estão autorizados pelo art. 129, III, da
Constituição e art. 8º, § 1º, da Lei 7.347/85 e, por possuírem natureza
investigatória, dispensam a fiel observância do princípio da ampla defesa, até
porque não visam impor sanções, mas sim, viabilizar a presente demanda
judicial. Nem por isso, contudo, podem ser considerados inválidos como meio de
prova (art. 427 do CPC), mormente no caso em análise, em que observado o
contraditório mínimo, isto é, houve informação, publicidade e participação do investigado,
inclusive de forma voluntariosa, o que lhe rendeu elogios por parte do
Ministério Público do Estado de São Paulo (vide fls. 554 do vol. III apartado).
Por
fim, impende destacar que o art. 332 do CPC admite no processo todos os meios
legais, bem como os moralmente legítimos, ainda que não especificados pelo legislador,
sendo este o caso dos procedimentos preparatórios. Logo, considero que a
simples impugnação genérica aos documentos não se presta à exclusão das referidas
provas do processo, que deverão ser apreciadas na forma do art. 131 do CPC,
quando da eventual análise do mérito. Indefiro.
4. Riscadura de expressões. A ré requer a riscadura
de expressões que entende injuriosas a sua pessoa, consoante descrito às fls.
115 da peça defensiva. Todavia, entendo que as expressões utilizadas pela parte
autora não transgridem o art. 15 do CPC, que trata do dever de urbanidade e
boa-fé processual, e tampouco consubstanciam intuito ofensivo. Demais disso, os
termos transcritos pelo Parquet, mormente aqueles constantes às fls. 57,
58 e 62, estão diretamente relacionados com os fatos alegados na vestibular,
constituindo o próprio mérito da ação, pelo que não há se falar em riscadura.
Afasto.
5. Limites territoriais da lide. O art. 16 da Lei n.º
7.347/85 (LACP) estabelece que “A sentença civil fará coisa julgada erga omnes,
nos limites da competência territorial do órgão prolator”. Com base nesta
regra legal, a ré requereu que o eventual pronunciamento jurisdicional fique
delimitado ao Município de São Paulo, com a observância do disposto no art. 472
do CPC, que trata dos limites subjetivos da coisa julgada. No entanto, a ação
civil pública possui um regramento jurídico peculiar e voltado à tutela dos
interesses coletivos, não sendo aplicável a limitação do art. 472 do CPC.
Outrossim,
o art. 16 da LACP já se encontra superado, eis que frontalmente contrário ao
direito de ação coletiva, que se embasa na indivisibilidade do objeto litigioso
e na efetividade da prestação jurisdicional. Além disso, seria ilógico e
irrazoável defender que uma idêntica situação pudesse se submeter a resultados
díspares em comarcas distintas de uma mesma região, procedimento claramente incompatível
com os princípios da economia processual, da igualdade e da ampliação do acesso
à jurisdição. Em verdade, houve na redação do art. 16 da LACP uma profunda
confusão entre o instituto da coisa julgada com o da competência, equívoco que
se mostra sanado pelos arts. 93 e 103 do CDC, conforme já exaustivamente
tratado pela doutrina e jurisprudência.
Assim
sendo, rejeito a preliminar de isolamento dos efeitos desta ação civil pública
ao Município de São Paulo, limitação esta que, de mais a mais, pulverizaria a
finalidade da ação coletiva, prejudicando sua própria razão de ser. Por outro
lado, também não prospera a assertiva preambular de que o interesse tutelado
abrange todo o território nacional, dado que as próprias investigações
administrativas apontam lesões setorizadas, ocorridas em apenas algumas
regiões, tanto que somente ajuizadas ações civis públicas sobre a temática em
Estados específicos, como Minas Gerais (vide vol. XXXI apartado) e Paraná (fls.
72/99 do vol. XXXII).
Consequentemente,
fica evidente que, não obstante a presente lide transcenda a municipalidade de
São Paulo, fica restrita ao âmbito do Estado paulista, aí abrangida a
jurisdição do Tribunal Regional da 2ª e da 15ª Região, ante a evidente conexão
e conforme preconiza a atual redação da Orientação Jurisprudencial n.º 130, II,
da SDI-II, do C. TST.
6. Legitimidade ativa do Ministério Público. A ré alega, ainda, que
o Ministério Público do Trabalho não detém legitimidade para propor a presente
ação civil pública, por entender que a matéria controvertida é afeta a
interesse individual e divisível. Contudo, ao contrário do que consta na
defesa, os interesses veiculados na petição inicial são afetos à saúde e ao
meio ambiente de trabalho e, como tais,representam verdadeiros direitos
coletivos “stricto sensu”, porquanto atingem os empregados ligados à ré
por uma relação jurídica base (o contrato do trabalho - art. 81, II, do CDC),
bem como terceiros indetermináveis, uma vez que a integridade física e
psicológica dos empregados do Banco Itaú supera os interesses do grupo, já que
toda a coletividade acaba prejudicada com a profusão das doenças ocupacionais.
Demais disso, a pretensão inicial é por uma tutela coletiva, não havendo
qualquer pedido em prol de pessoa determinável.
Em
todo caso, ainda que fosse diferente, entendo que o Ministério Público do
Trabalho possui legitimidade extraordinária ampla, inclusive, para veicular
interesses individuais homogêneos através de ação civil pública, ao menos
quando evidente a relevância jurídica da pretensão, de acordo com
posicionamento já exarado pelo Supremo Tribunal Federal, no RE n.º 163.231/SP.
Clara, portanto, a existência de direitos coletivos tuteláveis pela parte
autora, nos moldes do art. 129, III, da CF/1988 e do art. 6º, VII, “b” e “d”,
da Lei Complementar n.º 75/93, pelo que afasto a preliminar.
7. Possibilidade jurídica de pedido. Pela análise das
afirmações contidas na exordial, verifico que a condição da ação pertinente à
possibilidade jurídica do pedido encontra-se presente, já que não existe
vedação legal expressa aos pedidos formulados na exordial, uma vez que se
tratam de direitos de cunho trabalhista, que possuem, inclusive, clara previsão
em nosso ordenamento positivo. Note-se que a Lei da Ação Civil Pública não veda
a cumulação de pedidos de distinta natureza, limitando-se a descrever a
possibilidade de requerimentos alternativos. Afasto.
8. Prescrição. Ante a inexistência de inércia por parte do
legitimado ativo, bem assim tratando-se de demanda que versa sobre interesses
coletivos afetos ao direito fundamental à saúde, que é indisponível, inexiste
prazo prescricional a ser pronunciado no caso vertente.
9. Ergonomia e organização do trabalho (obrigações de
fazer). As
normas de ergonomia relacionam-se com a melhoria das condições de trabalho,
partindo da premissa de que é o trabalho que deve se adaptar ao homem, e não o
contrário. Trata-se de um princípio com previsão internacional (Convenções 155
e 161 da OIT), como também Constitucional (art. 7º, XII), sendo o seu
tratamento jurídico fornecido pelos arts. 154/158 e 198/199 da CLT e pela
Portaria 3.751/1990, do MTE – Ministério do Trabalho e Emprego. Tais normas,
por estarem afetas à saúde dos trabalhadores, se enquadram no núcleo de
indisponibilidade absoluta do direito trabalhista, merecendo tutela prioritária
por parte dos empregadores.
A
presente ação civil pública está diretamente ligada ao tema, uma vez que tem
por base diversas investigações promovidas pelo órgão ministerial a acusações
de desrespeito às normas de saúde e segurança do trabalho, com supostos danos
no ambiente laboral da ré, com altos índices de lesões por esforços repetitivos
(LER) em seus empregados. As denúncias datam desde o início da década de 1990 e
suas respectivas investigações restaram reunidas no PP - Procedimento
Preparatório n.º 905/2000, da Procuradoria Regional do Trabalho da 2ª Região
(PRT/02).
A
documentação trazida com o referido PP, relativa às provas colhidas pelo Parquet,
sobretudo no período havido de 1998 até meados de 2003, evidencia ter havido,
de fato, flagrante transgressão pelo Banco réu a importantes normas de
ergonomia. E, nestes autos, após uma longa instrução probatória, foram amplamente
confirmadas as evidências iniciais, com comprovação das assertivas do autor até
mesmo com relação ao período posterior ao ajuizamento da ação, conforme se nota
do laudo pericial da FUNDACENTRO (vol. XXXIX apartado, laudo I), devidamente
corroborado pelos pareceres técnicos juntados pelos assistentes do MPT (fls.
356/415) e da própria ré (fls. 1235/1251).
Com
efeito, as fotografias constantes de fls. 48/54 do laudo I da perícia (vol.
XXXIX) deixam manifesto que, mesmo depois de transcorridos mais de 15 anos das
primeiras denúncias em sede administrativa, manteve a ré o descumprimento de
regras básicas de saúde e medicina do trabalho, obrigando seus funcionários a
laborar em mobiliário sabidamente inadequado aos parâmetros definidos na NR-17
do MTE (Portaria n.º 3.214/78), com reiterada prorrogação da jornada diária e
sem a escorreita observância do intervalo de 1h00 previsto no art. 71 da CLT
(vide constatações de fls. 56/58 do mencionado laudo).
No
particular, chama atenção o fato de a ré ter trazido, já à época do Procedimento
Preparatório, documentação que supostamente demonstrava sua preocupação com a
LER, como se nota do doc. 04 do vol. VIII apartado, que “convida” o
trabalhador “a participar do Programa Saúde no Trabalho”, que começa com
um “módulo de prevenção e esclarecimentos sobre Lesão por Esforços
Repetitivos (LER)”. Referido módulo, em síntese, dispõe sobre aspectos ligados
à conduta do trabalhador e ao mobiliário, estabelecendo que a mesa de trabalho
deve ter “espaço suficiente para as diferentes atividades exercidas e para
movimentar equipamentos”, “o monitor deve ficar na frente do operador
e
estar ligeiramente abaixo da linha dos olhos” e “a tela não pode sofrer reflexos
decorrentes da luz ambiente”, aspectos estes amplamente descumpridos pela
própria ré, como demonstram as fotografias n.º 2, 4 e 5, respectivamente, do
aludido laudo FUNDACENTRO.
No
mesmo sentido, o parecer técnico do analista pericial da PRT/02, Dr. Mauro
Ziwian, relata uma série de irregularidades cometidas pela ré e também confirmadas
por fotografias (vide fls. 361, 363, 365, 366, 368, 370, 373 e 375).
Tais
provas demonstram, de forma inequívoca, o desrespeito a uma variada gama de
normas de ergonomia, tais como as previstas nos itens 17.1.1, 17.3.1, 17.3.2 e 17.5.3,
todas da NR-17. Logo, resta infirmada a alegação defensiva de que “o modelo
de atuação da área de saúde e segurança do trabalho do réu é exemplar”
(fls. 1663), visto se tratar de modelo meramente retórico, sem efetiva possibilidade
de concretização das normas tutelares da saúde dos trabalhadores, ante a
omissão patronal no cumprimento de seu próprio programa, situação que já havia
sido aferida na via administrativa pela equipe multidisciplinar composta por
membros da Secretaria de Saúde da Prefeitura do Município de São Paulo e pela
FUNDACENTRO, que, após analisar o material de prevenção então apresentado pelo
banco Itaú, concluiu que:
“A
partir da discussão do conteúdo e forma do material relativo ao programa de prevenção
às LER/DORT concluímos que o material apresentado não é suficiente para
a compreensão do funcionamento do programa no cotidiano da empresa. As ações devem
ser melhor caracterizadas (…)
O
material audiovisual e impresso apresentado tem caráter informativo, mas não
caracteriza por si mesmo uma ação preventiva, pois é necessário que a
informação seja coerente com as condições reais de trabalho. As contradições
entre a informação e as condições reais de aplicação podem redundar em impossibilidade
de seguir as recomendações” (vide fls. 1603 do vol. VIII apartado).”
Chama atenção, ainda, o fato de a ré ter
apresentado ao Ministério Público análises ergonômicas que, não obstante tentem
retratar uma situação de normalidade, acabam registrando irregularidades no
mobiliário e/ou na iluminação de diversas de suas agências na Grande São Paulo,
tais como as de n.º 0032, 0762, 0384, 065 e 1.024 (vide fls. 773/774, 778/785,
786/792, 796/802 e 806/811, todas do volume IV apartado, nos laudos enviados
pelo Banco Itaú ao Ministério Público). E, por oportuno, cumpre sublinhar a informação
prestada pelo assistente técnico da ré, Dr. Álvaro Frigério Paulo, segundo o
qual “os agentes ergonômicos presentes são os mesmos em todos os postos de
trabalho (...) independentemente da agência onde está localizado” (fls. 1261
dos autos principais). Ocorre que inadequações de iluminação e mobiliário, por
si só, constituem fatores ligados diretamente à aquisição e desencadeamento de
doenças ocupacionais, conforme art. 20 da Lei Federal n.º 8.213/91 e Instrução
Normativa INSS/DC n.º 98/2003, esta última responsável por reunir preciosas
informações científicas sobre LER/DORT.
Não bastasse, ficou assente no laudo pericial I da
FUNDACENTRO que os levantamentos ergonômicos da ré retratavam aspectos
meramente parciais da organização do trabalho havida em seus estabelecimentos,
desconsiderando questões relevantes como as diferenças antropométricas e
psicofisiológicas dos trabalhadores, o ritmo de trabalho ou o conteúdo de suas
tarefas (vide fls. 14 do laudo I). E, com relação a este tema, mostra-se
relevante o Relatório da Auditoria Fiscal do INSS, descrevendo que o labor em
regime suplementar era rotineiro no Itaú (fls. 17/59 do vol. XXIV apartado),
situação que foi mantida depois da propositura da ação (fls. 56 do laudo I da
FUNDACENTRO).
A isso tudo soma-se a gestão empresarial pautada em
excessivas metas de produtividade (vide fls. 15/21 do Laudo II da FUNDACENTRO),
que, como é cediço, bem atendem aos lucros da empresa, mas pouco ou nada
contribuem com a melhoria da condição social do trabalhador, norte do direito
trabalhista insculpido no “caput” do art. 7º da Constituição Federal. Isto
porque, de acordo com as vistorias da equipe técnica pericial, a busca por
resultados acaba por estimular o acréscimo de trabalho, sendo até mesmo
incompatível com a realização de pausas espontâneas (fls. 21 do laudo II).
Tanto é assim que, em sede administrativa, foi a ré alvo de algumas autuações
de agentes de fiscalização do trabalho, como a juntada às fls. 100 do vol. XII
apartado, que, dotada de fé pública, descreve o trabalho de entrada de dados
com toques superiores aos limites impostos pelo item 17.6.4 da NR-17.
Saliento que não prospera a comparação feita pelo
Banco réu ao controle de produtividade realizado por este E. TRT (fls.
1552/1554), porquanto se trata de situação distinta e que nem sequer se
encontra “sub judice”. Além disso, não se condena a edição de metas, mas
sim o seu uso desenfreado aliado a outros fatores nocivos a direitos
fundamentais dos trabalhadores (item 5.13 da NR-17), sendo que, na espécie,
ficou claro o descumprimento cumulado de normas relativas à medicina e
segurança do trabalho pela ré, com imposição de risco à saúde de diversos de
seus funcionários, como os caixas, ante o labor em condições ergonomicamente
inadequadas, com habitual extrapolação da jornada ordinária e mediante uma
gestão focada em metas. Tal quadro é nitidamente propício à profusão de doenças
ocupacionais como as lesões por esforços repetitivos e distúrbios
osteomusculares relacionados ao trabalho, fatos reconhecidos pelo assistente
técnico do MPT (fls. 356/412) e pelo perito judicial (fls. 59 do laudo) É bem verdade que este quadro não abarca, por
completo, todos os funcionários da ré, como bem descrito pelas razões finais
defensivas, onde consta cópia de decisão proferida por esta Vara, na qual
reconhecido, por exemplo, a ausência de extrapolação da jornada (fls. 1666).
Tal fato, no entanto, não se presta a descredenciar a perícia, que se mostrou
amparada por uma grande quantidade de decisões judiciais, todas tratando do
descumprimento de normas trabalhistas afetas à segurança e medicina do
trabalho, com reconhecimento de uma prestação generalizada de horas
suplementares (fls. 1140/1223).
Neste aspecto, transcrevo, a título ilustrativo
trechos de três julgados copiados nestes autos e que reconheceram a existência
de doença ocupacional em funcionários da ré, em razão das condições precárias
de trabalho, considerando o aspecto ergonômico:
1) “a reclamante comprovou, com êxito, a
ocorrência do dano, consistente na doença de que padece ( LER ), com perda da
capacidade laborativa, o que foi confirmada pelo laudo pericial (….) A
testemunha ouvida declarou (…) ainda, que o supervisor da reclamante sabia da
doença que a acometia, tendo presenciado a obreira reclamando das dores, tomando
remédios e sendo massageada, sendo certo que as condições ergonômicas não eram
favoráveis, não havendo apoio para os pés ou para as mãos” (Proc. n.º 00092-2006-007-02-00-5, trecho da sentença exarada pela MM.
Juíza Dra. Cláudia Zerati - fls. 1143).
2º) “...concluo que a doença da autora decorreu de
exclusiva culpa da demandada, que sequer se preocupou ou se atentou para a
necessidade de cumprimento de normas de segurança do trabalho, especialmente
quanto ás condições ergonômicas, nem comprovou nos autos que realizava
efetivamente exames clínicos regulares na obreira... (Processo n.º 02606-2005-015-02-00-0, excerto da sentença proferida
pelo MM. Dr. Mauro César Moreli – fls. 1150).
3º) “A prova oral colhida se fez importante e veio
a ratificar a tese de que as condições de trabalho da autora foram o principal
fator desencadeante do mal que a acometeu. A uma porque havia o elastecimento
exagerado da jornada (…) A duas porque não usufruíam intervalo regular
considerado a efetiva duração do labor (…) A três porque a testemunha trazida
pela própria ré, Sra. Marte, asseverou 'que no local não havia ginástica
laboral e não se recorda se o banco oferecia talas, apoios para pés...”
(passagem do julgado da MM. Juíza Dra. Rosana de Almeida Buono Russo, nos autos
n.º 02772.2005.041.02.00.3 - fls. 1190).
Igualmente, não prosperam as impugnações de
fragilidade da perícia e de cumprimento das normas trabalhistas vigentes à
época das investigações, ante a fidedigna análise das condições de trabalho
pela FUNDACENTRO, sendo amplamente rebatidas as alegações defensivas através
dos esclarecimentos de fls. 1361/1406 e 1586/1611. De fato, o conhecimento
científico sobre medicina, segurança e higiene do trabalho vigente à época das
investigações era mais que suficiente para que a ré adotasse uma postura
distinta da averiguada nos procedimentos preparatórios, mormente em se
considerando que os representantes da FEBRABAN participaram ativamente das
discussões que levaram à edição da NR-17, que trata da ergonomia desde
23/11/90. A IN INSS/ DC n.º 98/2003, ademais, explicita que as preocupações com
a ergonomia, inclusive para funções desempenhadas pelos bancários, já existia
muito antes de as investigações administrativas serem iniciadas.
Portanto, com base no art. 131 do CPC e nos
fundamentos supra expostos, acato a conclusão pericial e reconheço como
verídica a tese relativa à “patente ilegalidade da conduta do Réu, violando
gravemente os direitos coletivos de seus empregados”, pelo que condeno o ITAÚ
UNIBANCO, observados os limites do pedido inicial, a:
a) Cumprir integralmente a NR 17 da Portaria MTE
n.º 3.214/78, com suas alterações, adequando as condições de trabalho às características
psicofisiológicas dos trabalhadores;
b) Realizar levantamento ergonômico fiel à
realidade de seus estabelecimentos situados no Estado de São Paulo, abordando todos
os aspectos relacionados à organização do trabalho previstos na mencionada
Portaria, especialmente no que concerne aos itens 17.3 (mobiliário) e 17.4
(equipamentos) da NR-17;
c) Estabelecer pausas de 10 minutos a cada 50
minutos trabalhados nas atividades de entrada de dados, não deduzidos da
jornada normal de trabalho, na forma do item 17.6.4, “d” da norma regulamentar,
que prevalece sobre o art. 72 da CLT, por ser benéfico ao trabalhador. Com
relação às demais atividades requeridas pelo Parquet, contudo, inexiste
obrigação a ser imposta, ante a delimitação da atividade beneficiada pela
NR-17;
d) Respeitar o retorno gradativo às atividades do
trabalhador que, sendo encarregados de desempenhar atividades repetitivas,
fiquem afastados por período igual ou superior a 15 dias, salvo
recomendação
médica em sentido contrário (item 17.6.3 da NR-17);
Rejeito
os pedidos preambulares de estabelecimento de rodízio de empregados (2.4),
reposição da mão-de-obra licenciada (2.5) e não exigência de labor
extraordinário (3), por se tratarem de pleitos não amparados especificadamente
pela NR-17, ao menos de modo amplo e generalizado, como requer o Parquet.
Acolho, nestes termos.
10. Comunicados de acidente de trabalho (obrigação
de fazer).
O MPT alega que o Banco Itaú deliberadamente obstou
o reconhecimento de doenças ocupacionais em seus funcionários, subnotificando o
INSS das lesões por esforço repetitivo ocorridas em seus estabelecimentos. Em
resposta, a ré disse ter emitido o CAT – Comunicado de Acidente de Trabalho em
todos os casos em que comprovado o nexo causal entre a lesão e o labor,
aduzindo incidentalmente a inconstitucionalidade da Instrução Normativa n.º
98/2003, do INSS/DC, no tocante à exigência de notificação por mera suspeita de
nexo etiológico.
Pois bem. Ante o que já exposto acima, é possível
concluir que as doenças ocupacionais e o consequente prejuízo à saúde dos
trabalhadores representam um tema intimamente ligado à degradação do meio
ambiente laboral (art. 200, VIII, da CF/1988). Este, de seu turno, é apenas um
dos aspectos do meio ambiente previsto no art. 225 da Constituição Federal,
porquanto, como bem salienta Norma Padilha:
“quando a Constituição Federal, em seu art. 225,
fala em meio ambiente ecologicamente equilibrado, está mencionando todos os
aspectos do meio ambiente. E, ao dispor, ainda, que o homem para encontrar uma
sadia qualidade de vida necessita viver neste ambiente ecologicamente
equilibrado, tornou obrigatória também a proteção do ambiente no qual o homem,
normalmente, passa a maior parte de sua vida produtiva, qual seja, o do trabalho.”
Vê-se, portanto, que a questão em comento exige o
diálogo entre os princípios protetivos do direito trabalhista com os princípios
preventivos do direito ambiental, aplicáveis sobretudo aos sujeitos que
empreendem atividade econômica, como ocorre com a ré (art. 170, VI, da
CF/1988). O princípio da prevenção e da precaução contam com assento na Lei
Maior (art. 225, “caput”) e, em síntese, impõem deveres de conduta no
sentido de preservar o meio ambiente contra qualquer tipo de degradação, ainda
que desconhecida. Seu objetivo é evitar a ocorrência de danos ambientais
irreversíveis, não servindo a falta de certeza científica como escusa para
postergar a adoção de medidas de prudência.
Desse modo, inexiste inconstitucionalidade material
ou formal a ser declarada, dado que a IN n.º 98/2003, ao prever a necessidade
de notificação por mera suspeita, apenas confirmou o princípio da precaução,
reiterando obrigações já contidas na Constituição e na legislação federal, como
se vê no art. 169 da CLT e 336 do Decreto n.º 3.048/1999. Como se não bastasse,
é preciso lembrar que, por ocasião da Lei n.º 11.340/2006, foi criado o NTEP –
Nexo Técnico Epidemiológico, uma metodologia que tem como objetivo identificar quais
doenças estão relacionados com a prática de determinada atividade profissional,
através do cruzamento de dados do CNAE da empresa com a incidência da CID-10
alusiva à moléstia (art. 21-A da Lei 8.213/91). A regulamentação do NTEP,
trazida pelo Decreto n.º 6.042/2007, deixa certo que as LER/DORT (intervalo CID
M60-M79) estão diretamente associadas à atividade de bancos múltiplos como a ré
(CNAE 6422).
Não prospera, ademais, a alegação simplista do réu
de que as lesões por esforço repetitivo são multicausais, visto que os fatores
de risco são dependentes entre si (OS n.º 606/98, do INSS). Além do mais,
conforme descrito na Instrução Normativa em comento, “não se tem
conhecimento de nenhum estudo que indique tarefas domésticas como causas de
quadros do sistema músculo-esquelético semelhantes aos quadros das LER/DORT; em
contraposição, há vários que demonstram associação entre fatores laborais de
diversas categorias profissionais e a ocorrência de LER/DORT”.
De todo modo, o lastro probatório capitaneado pelo
laudo FUNDACENTRO deixou claro que a negligência da ré com relação às normas de
ergonomia atuou como fator apto a desencadear lesões ocupacionais, o que, por si
só, imporia o dever de notificação com relação às moléstias constatadas.
Entretanto, ressalvadas algumas situações
excepcionais (fls. 1552/1554), tal comportamento não foi observado pela ré,
tanto que diversos trabalhadores tiveram de se socorrer ao Sindicato da
categoria, que, em alguns períodos, chegou a emitir mais CATs que o próprio
banco (fls. 02 do vol. XI apartado).
Destarte, acolho o pedido “5” da vestibular e
condeno a ré a emitir Comunicação de Acidente de Trabalho para os empregados
que apresentem sintomas de LER/DORT, com suspeitas da ocorrência da doença,
traduzidas em atestados médicos ou exames ainda que emitidos por médicos não
pertencentes ou contratados pelo réu, visto que a atuação isolada destes não se
mostrou apta a fazer valer o direito fundamental à prevenção da saúde. Acolho,
nestes termos.
11. Programa de controle de saúde (obrigação de fazer).
Conforme averiguado pelo expert, a ré não
apresentou o PPRA - Programa de Prevenção dos Riscos Ambientais, e o PCMSO - Programa
de Controle Médico de Saúde referentes ao ano de 2000, presumindo-se sua
inexistência. E, com relação aos períodos subsequentes, juntou documentos
padronizados, sem a especificação de aspectos relevantes à medicina e saúde do
trabalho, tais como as efetivas jornadas de trabalho, pausas, exigências
posturais etc.
Em princípio, não vislumbro óbice na confecção de
PPRA e PCMSO padronizados, já que os estabelecimentos bancários são similares,
com funções até mesmo idênticas. O que não se admite, todavia, é a
inobservância das regras previstas na Portaria n.º 3.214/78 do MTE, que exige a
adoção, por parte das empresas, de uma metodologia de ação que garanta a
preservação da saúde dos trabalhadores frente aos riscos dos ambientes de
trabalho, identificando precocemente qualquer desvio que possa comprometer a
integridade daqueles.
Não foi o que ocorreu na hipótese, porquanto o
programa de prevenção de riscos da ré se mostrou retórico, prejudicando o
efetivo controle médico da saúde dos obreiros.
Realmente, como se não bastasse os desrespeitos às
regras de ergonomia acima descritas (“item 9”), o perito judicial constatou que
o PCMSO de 2007 nem mesmo traz orientação à emissão de CAT e de rastreamento de
LER/DORT, infringindo as disposições previstas no art. 169 da CLT e 336 do
Regulamento da Previdência Social, normas também já mencionadas acima. Além
disso, o programa da ré não informa quais funcionários efetivamente estão
expostos aos riscos ambientais, em flagrante desrespeito às normas de medicina
e segurança do trabalho (fls. 1591). Não por menos, a conclusão pericial foi no
sentido de que o PCMSO trazido com a defesa se limita a trazer “informações
incompletas e tecnicamente deficientes” (vide fls. 14 e 21 do laudo
FUNDACENTRO).
Portanto, com base no art. 7º, XXII da Constituição
Federal, acolho o pedido e condeno o Banco réu a elaborar e implementar
programas de efetiva prevenção e controle de riscos ambientais, observado o
seguinte:
a) A ré deverá analisar a realidade
do trabalho executado por seus empregados, nos termos da NR-09 da Portaria
3.214/78, elaborando PCMSO que contenha a descrição detalhada de cada função,
com os respectivos riscos e a periodicidade dos exames médicos, nos moldes da
NR-07 da mesma Portaria;
b) Para os empregados expostos a
riscos de doenças ocupacionais, especialmente os do setor do bankfone e
os operadores de caixas, ou os que se situem em situações que impliquem o
desencadeamento ou agravamento de doença ocupacional (ambiente em desacordo com
a NR-17), os exames médicos periódicos deverão ser realizados em intervalos de
no máximo 01 (um) ano, conforme item 7.4.3.2, “a”, da NR-07;
c) O PCMSO deverá obedecer a um
planejamento em que estejam previstas as ações de saúde a serem executadas
durante o ano, devendo tais ações ser objeto de relatório anual que,
necessariamente, deverá discriminar, por setores da empresa, o
número e a natureza dos exames médicos, incluindo
avaliações clínicas e exames complementares, estatísticas de resultados
considerados anormais, assim como o planejamento para o próximo ano, tomando
como base o modelo proposto no Quadro III da NR-07 (item 7.4.6).
12. Discriminação aos portadores de LER/DORT (obrigações de
não fazer). Segundo as narrativas iniciais, ainda, a ré teria implantado
uma política de discriminação aos trabalhadores acometidos de LER/DORT, realizando
dispensas indevidas ou mesmo forçando os lesionados a pedir demissão, mediante
condutas equiparadas ao assédio moral. Tais assertivas também foram embasadas
em provas produzidas na seara administrativa, devidamente carreadas como
Procedimento Preparatório – PP n.º 3.604/02 (volumes XX e XXXIV a XXXVII
apartado). Em resposta, o Banco escreveu que jamais submeteu seus empregados a
procedimentos vexatórios ou discriminatórios e aduziu ter instituído um
frutífero programa de reabilitação profissional desde 2003, não havendo se
falar em assédio moral.
Pois bem. As investigações administrativas
relativas à discriminação contaram com a participação ativa do Sindicato dos Bancários
e Financiários de São Paulo, Osasco e Região e dão conta de que a ré,
efetivamente, realizou a rescisão contratual de uma série de funcionários
acometidos de doença (vide fls. 4/28 do volume XXXIV apartado). Nesse ponto,
mostra-se cristalina a preambular ao transcrever relatos como o prestado pelos
trabalhadores Luciana Coelho Lanza (fls. 24), Ricardo Gonçalves Neto (fls. 27),
Roberto Donate (fls. 31), Tadeu Queiroz da Silva (fls. 34/35) e Denise Notaro
(fls. 38/39), aos quais ora se faz remição. Os TRCTs juntados com o volume XXXV
apartado, por sua vez, evidenciam que não foram poucos os obreiros doentes
dispensados pela ré.
Outrossim, os depoimentos copiados às fls.
1139/1222 (sentenças judiciais) dão conta que a discriminação atingiu uma gama variada
de trabalhadores, inclusive depois de ajuizada a presente ação, não se
limitando àqueles apontados pelo Parquet. Note-se, no particular, que se
tratam de relatos colhidos judicialmente, com a observância do princípio da
ampla defesa e do contraditório, sendo que tais relatos acabaram por
consubstanciar, em muitos casos, decisões já transitadas em julgado.
Sendo assim, entendo fragilizada a tese defensiva
de que o Banco jamais discriminou ou assediou moralmente seus funcionários,
restando demonstrado que esta prática era mais habitual do que deveria,
constituindo quase um padrão de comportamento daquele, obviamente com algumas
exceções (vide decisão copiada às fls. 1564/1567, que julgou improcedente o
pedido de assédio moral por ausência de provas). A discriminação, ademais, não
se restringia às dispensas, tendo a perícia aferido a existência de algumas
situações de isolamento e tratamento humilhante aos portadores de doença, que,
em outros, eram tratados como um estorvo dentro do Banco, circunstâncias que estimulavam
pedidos de demissão (vide fls. 1596).
Também neste aspecto aponto três julgados
proferidos em face do Banco Itaú, constantes nestes autos e esclarecedores
sobre a matéria:
1º) “... a dispensa da reclamante caracterizou-se
como obstativa, pois a impediu de gozar o benefício acidentário que decorreria
da doença profissional desenvolvida pelo labor para a reclamada. Acaso a ré
cumprisse com sua obrigação, expedindo novo CAT, com encaminhamento da
reclamante ao INSS, para tratamento da doença profissional, ela receberia
auxílio-doença acidentário, findo o qual se iniciaria o prazo estabilitário de
que trata o art. 118 da Lei 8.213/91...” (excerto da
sentença proferida pela MM. Juíza Dra. Erotilde Ribeiro dos Santos Minharro, no
Processo n.º 1029/2004, da 20ª VT/SP – vide fls. 1171).
2º) “Em segundo lugar, ao contrário do alegado pela
reclamada, não houve ato jurídico perfeito, porque o autor, quando da
homologação da rescisão, manifestou-se contrário ao despedimento, anotando no verso
do TRCT que estava em tratamento médico em razão de LER/DORT e que estava com
cirurgia marcada (fls. 16-verso), e esse fato não podia ter sido desprezado
pela reclamada e nem mesmo pelo Fiscal do Trabalho que os atendeu” (trecho do julgado da lavra do MM. Juiz Dr. Marcelo Donizeti Barbosa,
nos autos do Processo n.º 663/2003, da 39ª VT/SP – vide fls. 1186).
3º) “A prova
produzida não afasta a conclusão de que a querelante, ao ser dispensado, encontrava-se
em recuperação de enfermidade incapacitante diagnosticada e aceita pelo INSS, e
essa enfermidade teve nexo com o posto ocupado na instituição bancária” (fragmento
da sentença prolatada pelo MM. Juiz Dr. Alvaro Emanuel de Oliveira Simões, no Proc.
n.º 00095/2008, da 57ª VT/SP – fls. 1222).
Mais uma vez, cumpre salientar que imposição de
metas de controle de qualidade de serviço e o incentivo à produtividade
constituem medidas lícitas e insertas no poder diretivo patronal. Entretanto,
tais medidas devem ser adotadas em consonância com o valor social do trabalho e
a dignidade da pessoa humana, fundamentos maiores da República Federativa do
Brasil (art. 1º, I e IV da CF/88) e que orientam tanto a ordem social quanto a
econômica (arts. 170 e 193 da Lei Maior). Devem, além disso, respeitar a função
social da empresa e do contrato, observado o princípio da boa-fé objetiva, que
traça deveres de conduta para ambas as partes da relação de emprego (arts. 421
e 422 do Código Civil), sob pena de, ao priorizar apenas um lado da relação
contratual, como ocorreu na hipótese, descambar na figura do abuso de direito,
comportamento tipificado como ilícito pelo art. 187 do Código Civil.
De outra sorte, cumpre destacar que o Banco Itaú
avançou consideravelmente no quesito da reabilitação profissional, tendo
implementado, desde 2003, um programa reconhecido pela Associação Brasileira de
Qualidade de Vida (fls. 979) e considerado eficiente, nestes autos, pela
própria FUNDACENTRO (fls. 1265).
Neste aspecto, entendo que apesar de o laudo dispor
que o programa é insuficiente por traduzir um procedimento “que acompanha a
gestão do trabalho na empresa, focado na readaptação de pessoas ao mesmo
ambiente e a lógica de gestão de trabalho” (fls. 31 do laudo), não houve,
por parte da perícia ou do autor, qualquer indicação objetiva de parâmetro
alternativo efetivamente capaz de ser adotado.
Diante desses fatos, excetuada apenas a questão da
reabilitação, acato novamente a conclusão pericial, inclusive no que tange à
uniformidade do assédio moral (fls. 1597), eis que configurada a existência de
um verdadeiro assédio estratégico por parte da ré, com organização de suas
estruturas e políticas não apenas na maximização do lucro, como também na
exclusão daqueles que não se enquadram no perfil gerencial do Banco,
notadamente os portadores de LER/DORT, discriminados através do isolamento, da subnotificação
ao INSS e até pela rescisão contratual, como atesta às fls. 16/20 do laudo II
da FUNDACENTRO.
Assim sendo, ante as assertivas supra expostas,
acolho parcialmente o pedido, condenado a ré a:
a) Abster-se de rescindir o
contrato de trabalho e de comunicar a rescisão contratual de empregados
acometidos por LER/DORT e que se encontrem em tratamento de saúde, gozo e
auxílio doença ou reabilitação profissional.
b) Não submeter seus empregados com
suspeita ou confirmação de doença aos seguintes procedimentos vexatórios ou
discriminatórios: inserção em locais isolados, obrigação de inação (“não
dação de tarefas para executar”), divulgação de dados médicos sigilosos e
realização de transferências sucessivas.
Improcede o pleito relativo às outras medidas
requeridas pelo Ministério Público, visto que a condenação através de um
comando genérico implicaria insegurança jurídica e nítida dificuldade de
cumprimento.
13. Das condições de cumprimento das obrigações de fazer e não
fazer e da tutela antecipada. O Ministério Público
requer a antecipação dos efeitos da tutela, aduzindo a presença dos
pressupostos legais elencados pelo art. 273 do CPC. Realmente, não apenas houve
verossimilhança, mas comprovação das assertivas iniciais, sendo patente o
perigo de dano irreparável ou de difícil reparação, tendo em vista que a
presente ação civil pública objetiva, em última análise, tutelar o direito
fundamental à saúde dos trabalhadores, considerado cláusula pétrea pela
Constituição Federal (art. 60, § 4º, IV). Assim sendo, defiro a tutela
antecipada requerida, pelo que as cominações relativas às obrigações de “não
fazer” acima descritas (“item 12”) passam a vigorar no prazo de 8 dias da
publicação da presente decisão.
Por outro lado, tratando-se decisão que abrange
todo o Estado de São Paulo, mostra-se imprescindível a concessão de um prazo
mínimo para que o Banco Itaú possa adequar seu comportamento ao comando
judicial comissivo, tendo em vista a grande quantidade de estabelecimentos que
possui e a consequente dificuldade operacional daí derivada. Assim sendo,
concedo à ré o prazo improrrogável de 180 dias para implementar integralmente
as obrigações “de fazer” ora impostas (itens 9, 10 e 11), tudo sob pena de
arcar com uma multa diária de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) por infração, a ser
revertida ao FAT ou aos cofres da União, na hipótese de extinção daquele, nos
termos dos arts. 287 e 461 do CPC c/c art. 11 da Lei 7.347/85.
Registre-se que as multas ora fixadas são devidas
tanto em razão do descumprimento da antecipação dos efeitos da tutela quanto da
decisão final, observado, porém, o limite de R$ 500.000,00 para cada infração,
montante ora imposto sem prejuízo de futura e eventual majoração, com vistas a
prestigiar a tutela específica. Acolho, nestes termos.
14. Da indenização face aos danos causados. A parte autora requer, por fim, a condenação do Banco Itaú em uma
indenização por danos morais coletivos, conforme autorizam os artigos 1º da Lei
7.347/85 e 6º, VI e VII do CDC, alegando que as lesões causadas não se
restringem ao aspecto físico ou mesmo individual dos trabalhadores acometidos
de quadro patológico.
De fato, o comportamento do Banco ultrapassou a
dimensão individual, já que a lesão ao meio ambiente, nele incluído o do
trabalho, atinge um bem jurídico de fundamental importância a toda a
coletividade, depreciando o aspecto objetivo da dignidade da pessoa humana1, e
não meramente subjetivo de cada um dos trabalhadores porventura lesados. Dito
isso, e diante da comprovação quase integral das assertivas iniciais, resta
devida uma indenização por danos morais coletivos, dado que as práticas lesivas
à integridade física e psíquica dos empregados da ré, o desrespeito reiterado
às normas de ergonomia, as subnotificações de doenças e as discriminações aos
trabalhadores trouxeram indubitável prejuízo à categoria dos profissionais
contratados pela ré e à própria coletividade, ante o quadro de múltiplas
ofensas a direitos fundamentais destes.
Cabe salientar que a responsabilidade por danos ao
meio ambiente é objetiva, dispensando a apreciação da culpa (art. art. 14, § 1º
da Lei 6.938/81).
Nada obstante, restou comprovado nos autos que os
danos decorreram do descumprimento reiterado de obrigações legais pelo Banco
Itaú em todo o Estado de São Paulo, como já reconhecido nestes autos. Por sua
vez, a análise do valor indenizatório para a compensação do dano moral sofrido
deve ser realizada por arbitramento, medido pela extensão do dano (art. 944 do
Código Civil) aliada a fatores como a situação econômica do ofensor, a dimensão
de sua culpa, a relevância do bem jurídico, além das circunstâncias do caso
concreto, aspectos estes que impedem a existência de uma tabela prévia de indenização.
Dito isso, e estando presentes os requisitos para a caracterização do dano
moral coletivo, condeno a ré a pagar o montante de R$ 1.000.000,00 (um milhão
de reais), conforme postulou o autor, a ser revertida ao FAT ou aos cofres da
União, na hipótese de extinção daquele.
Esclareço, por oportuno, que os ilícitos de tal
monta, que atingem uma coletividade de trabalhadores, não comportam
indenizações irrisórias, porquanto o instituto da compensação do dano moral
coletivo deve ser lido como forma de recomposição ou ao menos compensação ao
bem jurídico lesado, com vistas à adequação do comportamento do infrator e
consequente pacificação social. Demais disso, o importe postulado pelo Parquet
se mostra razoável à hipótese, dada a dimensão do dano e a relevância do
bem jurídico tutelado, não havendo se falar em exorbitância.
Acolho, nestes termos.
III – DISPOSITIVO
Do exposto, o juízo da 44ª Vara do Trabalho de São
Paulo resolve afastar as preliminares suscitadas pela ré e julgar PARCIALMENTE
PROCEDENTES os pedidos consignados na presente ação civil pública ajuizada
pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO DA 2ª REGIÃO em face de ITAÚ UNIBANCO S/A,
condenando a ré a:
a) Cumprir integralmente a NR 17 da
Portaria MTE n.º 3.214/78, com suas alterações, adequando as condições de
trabalho às características psicofisiológicas dos trabalhadores;
b) Realizar levantamento ergonômico
fiel à realidade de seus estabelecimentos, abordando todos os aspectos
relacionados à organização do trabalho previstos na Portaria 3.214/78 do MTE, especialmente
no que concerne aos itens 17.3 (mobiliário) e 17.4 (equipamentos) da NR-17;
c) Estabelecer pausas de 10 minutos
a cada 50 minutos trabalhados nas atividades de entrada de dados, não deduzidos
da jornada normal de trabalho, na forma do item 17.6.4, “d” da NR-17;
d) Respeitar o retorno gradativo às
atividades dos trabalhadores que, sendo encarregados de desempenhar atividades
repetitivas, fiquem afastados por período igual ou superior a 15 dias, salvo
recomendação médica em sentido contrário (item 17.6.3 da NR-17);
e) Emitir CAT - Comunicação de
Acidente de Trabalho para os empregados que apresentem sintomas ou suspeitas de
LER/DORT, traduzidas em atestados ou exames médicos, ainda que não pertencentes
ou contratados pela ré;
f) Analisar a realidade do trabalho
executado por seus empregados, nos termos da NR-09 da Portaria 3.214/78,
elaborando PCMSO que contenha a descrição detalhada de cada função, com os
respectivos riscos e a periodicidade dos exames médicos, nos moldes da NR-07 da
mesma Portaria;
g) Realizar exame médico anual nos
empregados expostos a riscos de doenças ocupacionais, especialmente os do setor
do bankfone e os operadores de caixas, bem assim aqueles que se
encontrem em situações que impliquem o desencadeamento ou agravamento de doença
ocupacional, conforme item 7.4.3.2, “a”, da NR-07;
h) O PCMSO deverá obedecer a um
planejamento em que estejam previstas as ações de saúde a serem executadas
durante o ano, devendo tais ações ser objeto de relatório anual que,
necessariamente, deverá discriminar, por setores da empresa, o número e a
natureza dos exames médicos, incluindo avaliações clínicas e exames
complementares, estatísticas de resultados considerados anormais, assim como o planejamento
para o próximo ano, tomando como base o modelo proposto no Quadro III da NR-07
(item 7.4.6);
i) Não rescindir o contrato de
trabalho e abster-se de comunicar a rescisão contratual de empregados
acometidos por LER/DORT e que se encontrem em tratamento de saúde, gozo de
auxílio doença ou reabilitação profissional;
j) Não submeter seus empregados com
suspeita ou confirmação de doença aos seguintes procedimentos vexatórios ou
discriminatórios: inserção em locais isolados, obrigação de inação (“não
dação de tarefas para executar”), divulgação de dados médicos sigilosos e
realização de transferências sucessivas;
k) Pagar uma indenização por dano
moral coletivo, ora arbitrada em R$ 1.000.000,00 (um milhão de reais), valor
este já corrigido, tudo nos termos da fundamentação supra.
Ante o deferimento da antecipação dos efeitos da
tutela, a ré deverá implementar as determinações “a” a “h” (obrigações de
fazer) no prazo improrrogável de 180 dias na intimação da presente decisão e as
medidas “i” e “j” (obrigações de não fazer) no de 8 dias, também contados da
intimação da presente decisão, tudo sob pena de multa diária de R$ 5.000,00
(cinco mil reais) para cada infração, ora limitada a R$ 500.000,00, a ser
revertida ao FAT ou aos cofres da União, na hipótese de extinção dquele. Já a
determinação “k” (obrigação de pagar) somente se mostra exigível depois de
transcorrido o trânsito em julgado, devendo também ser destinada ao FAT ou,
sucessivamente, à União, na hipótese de extinção do primeiro.
A presente decisão se dirige a todos os
estabelecimentos da ré situados no Estado de São Paulo (OJ n.º 130, II, da
SDI-II, do C. TST).
Juros de mora de 1% ao mês, a partir do ajuizamento
da ação. A correção monetária prevista em lei deverá incidir a partir da data
da prolação da sentença, nos termos das Súmulas 200 e 439 do TST. Indevidas
contribuições fiscais ou previdenciárias, ante a natureza indenizatória das
verbas supra deferidas e nos termos da Súmula 368 do C. TST. Eventual
descumprimento das obrigações de fazer e não fazer deverá ser monitorado e
comunicado pela parte autora, observando-se, quando possível, a existência de
decisão transitada em julgado.
Custas, pela ré, no importe de R$ 20.000,00,
calculadas sobre o valor da condenação ora arbitrada em R$ 1.000.000,00.
Intimem-se as partes, sendo o Ministério Público do
Trabalho de forma pessoal nos autos, tal como estabelece o art. 18, inciso II,
alínea “a”, da Lei Complementar 75/93. Nada mais.
RICARDO MOTOMURA
Juiz do Trabalho
AGRADECIMENTOS:
Forte
abraço aos mais de 12.000 leitores que subscrevem nossa Newsletter, dentre
advogados, juízes, servidores do judiciário, estudantes de direito e de
concursos, ocupantes de cargos em diversos RHs, e muitos leigos, o que
considero um sinal de credibilidade.
Agradeço
demais aos leitores mais fiéis que costumam mandar sugestões de pautas e
assuntos para serem estudados e debatidos no Blog. Vocês enriquecem e ensinam
demais para este Blogueiro.
Finalmente,
penhoradamente manifesto meu apreço àqueles que compartilham nosso conteúdo nas
diversas redes sociais.
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