Comentário do Blog: Conforme o Blog já havia comentado na semana passada (leia O inciso IV da Súmula 331 do TST e a Súmula Vinculante nº 10 do STF ), o inciso IV da Súmula 331 do TST, ao prever a responsabilidade subsidiária das entidades ou órgãos da Administração Pública direta e indireta pela inadimplência das empresas contratadas para prestação de serviços terceirizados, estava sendo objeto de várias provocações junto ao STF – em várias reclamações constitucionais e uma ADC –, estas exigindo análise em confronto com o disposto do artigo 71 da Lei 8666/93.
O TST, para defender o verbete do inciso IV da Súmula 331, esclareceu que o parágrafo 1º do art. 71 da Lei 8666/93 trata de responsabilidade direta da Administração Pública, mas não a subsidiária, em razão da culpa “in eligendo” e “in vigilando”. Em síntese, informou que o citado artigo 71 trata da responsabilidade solidária e não da subsidiária, persistindo esta última para fins trabalhistas; não se trata de análise da constitucionalidade da norma, mas sim de “afastar sua aplicabilidade”.
Este entendimento do TST deu margem àqueles que interpretavam haver uma equivalente análise da constitucionalidade do artigo 71 da lei 8666/93. Por isso, propuseram reclamações e uma ADC (nº 16) para apreciação pelo STF.
O julgamento abordou questões complexas, tal como a Constitucionalidade formal da própria edição do verbete da Súmula. Isto, devido ao fato da Súmula 331 do TST haver sido editada a partir de um Incidente de Uniformização de Jurisprudência, ao passo que a Súmula Vinculante nº 10 cristalizou entendimento pela observância da cláusula de reserva de plenário (art. 97 da CF) para o enfrentamento de matérias constitucionais pelos Tribunais.
Cabe ressaltar ainda neste comentário, que o título da notícia abaixo veiculada pela assessoria de imprensa do STF está tecnicamente incorreto. Na verdade, a União (assim como Estados, Municípios e Distrito Federal) pode sim ser responsabilizada pela inadimplência de empresas contratadas, desde que os Tribunais Trabalhistas investiguem nos fatos trazidos em cada caso concreto, a falta ou a falha na fiscalização por parte da Administração Pública. Em curtas palavras:
1º.) Os Tribunais Trabalhistas não devem condenar subsidiariamente a Administração Pública pelo inadimplemento das prestadoras contratadas, utilizando como fundamento a inconstitucionalidade do artigo 71 da Lei 8666/93;
2º) A condenação subsidiária da Administração Pública não deve ser declarada somente com a simples aplicação do inciso IV da Súmula 331 do TST, mas deve ser fundamentada na comprovação de elementos que explicitam a ausência ou falha de fiscalização junto à empresa contratada;
Sinceramente, especificamente quanto a este segundo requisito estabelecido pelo STF, este escriba sente que há uma inconsistente retomada do conceito de responsabilidade subjetiva do Estado, ou seja, há colidência com a responsabilidade objetiva estabelecida no §6º do artigo 37 da CF.
Ora, o §6º do artigo 37 ao prever que “as pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros”, grosso modo não faz distinção quanto ao tipo de responsabilidade, se civil ou trabalhista. Diz respeito, portanto, a qualquer dano, inclusive a responsabilidade trabalhista.
Feitas as considerações do Blog, vamos então à transcrição deste importante pronunciamento do STF, julgamento este que infelizmente vai trazer significativa mudança nos futuros pronunciamentos dos órgãos da Justiça do Trabalho. Cremos, inclusive, que o verbete do inciso IV da Súmula 331 vai sofrer mudança de texto, para adaptar-se ao atual entendimento da nossa mais alta Corte.
Eis a notícia:
União não é responsável por pagamentos trabalhistas na inadimplência de empresas contratadas, decide STF
Por votação majoritária, o Plenário do Supremo Tribunal Federal declarou, nesta quarta-feira (24), a constitucionalidade do artigo 71, parágrafo 1º, da Lei 8.666, de 1993, a chamada lei de licitações. O dispositivo prevê que a inadimplência de contratado pelo Poder Público em relação a encargos trabalhistas, fiscais e comerciais não transfere à Administração Pública a responsabilidade por seu pagamento, nem pode onerar o objeto do contrato ou restringir a regularização e o uso das obras e edificações, inclusive perante o Registro de Imóveis.
A decisão foi tomada no julgamento da Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC) nº 16, ajuizada pelo governador do Distrito Federal em face do Enunciado (súmula) 331 do Tribunal Superior do Trabalho (TST), esta qual, contrariando o disposto no parágrafo 1º do mencionado artigo 71, responsabiliza subsidiariamente tanto a Administração Direta quanto a indireta, em relação aos débitos trabalhistas, quando atuar como contratante de qualquer serviço de terceiro especializado.
Reclamações
Em vista do entendimento fixado na ADC 16, o Plenário deu provimento a uma série de Reclamações (RCLs) ajuizadas na Suprema Corte contra decisões do TST e de Tribunais Regionais do Trabalho fundamentadas na Súmula 331/TST. Entre elas estão as RCLs 7517 e 8150. Ambas estavam na pauta de hoje e tiveram suspenso seu julgamento no último dia 11, na expectativa de julgamento da ADC 16. Juntamente com elas, foram julgadas procedentes todas as Reclamações com a mesma causa de pedir.
Por interessar a todos os órgãos públicos, não só federais como também estaduais e municipais, os governos da maioria dos estados e de muitos municípios, sobretudo de grandes capitais, assim como a União, pediram para aderir como amici curiae (amigos da corte) nesta ADC.
Alegações
Na ação, o governo do DF alegou que o dispositivo legal em questão "tem sofrido ampla retaliação por parte de órgãos do Poder Judiciário, em especial o Tribunal Superior do Trabalho (TST), que diuturnamente nega vigência ao comando normativo expresso no artigo 71, parágrafo 1º da Lei Federal nº 8.666/1993”. Observou, nesse sentido, que a Súmula 331 do TST prevê justamente o oposto da norma do artigo 71 e seu parágrafo 1º.
A ADC foi ajuizada em março de 2007 e, em maio daquele ano, o relator, ministro Cezar Peluso, negou pedido de liminar, por entender que a matéria era complexa demais para ser decidida individualmente. Posta em julgamento em setembro de 2008, o ministro Menezes Direito (falecido) pediu vista dos autos, quando o relator não havia conhecido da ação, e o ministro Marco Aurélio dela havia conhecido, para que fosse julgada no mérito.
Hoje, a matéria foi trazida de volta a Plenário pela ministra Cármen Lúcia Antunes Rocha, uma vez que o sucessor do ministro Direito, o ministro Dias Toffoli, estava impedido de participar de seu julgamento, pois atuou neste processo quando ainda era advogado geral da União.
Na retomada do julgamento, nesta quarta-feira, o presidente do STF e relator da matéria, ministro Cezar Peluso, justificou o seu voto pelo arquivamento da matéria.
Segundo ele, não havia controvérsia a ser julgada, uma vez que o TST, ao editar o Enunciado 331, não declarou a inconstitucionalidade do artigo 71, parágrafo 1º, da Lei 8.666.
Ainda segundo o ministro, o presidente do TST, solicitado a prestar informações sobre o caso, relatou que aquela Corte reconhece a responsabilidade da administração com base em fatos, isto é, no descumprimento das obrigações trabalhistas, não com base na inconstitucionalidade da norma discutida na ADC. “Como ele não tem dúvida sobre a constitucionalidade, não há controvérsia”, concluiu o ministro presidente.
Mas, segundo o presidente do STF, isso “não impedirá o TST de reconhecer a responsabilidade, com base nos fatos de cada causa”. “O STF não pode impedir o TST de, à base de outras normas, dependendo das causas, reconhecer a responsabilidade do poder público”, observou ele, em outra intervenção. Ainda conforme o ministro, o que o TST tem reconhecido é que a omissão culposa da administração em relação à fiscalização de seus contratados gera responsabilidade.
Em seu voto, a ministra Cármen Lúcia divergiu do ministro Cezar Peluso quanto à controvérsia. Sob o ponto de vista dela, esta existia, sim, porquanto o enunciado do TST ensejou uma série de decisões nos Tribunais Regionais do Trabalho (TRTs) e, diante delas e de decisões do próprio TST, uma série de ações, sobretudo Reclamações (RCLs), junto ao Supremo. Assim, ela se pronunciou pelo conhecimento e pelo pronunciamento da Suprema Corte no mérito.
O ministro Marco Aurélio observou que o TST sedimentou seu entendimento com base no artigo 2º da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), que define o que é empregador, e no artigo 37, parágrafo 6º da Constituição Federal (CF), que responsabiliza as pessoas de direito público por danos causados por seus agentes a terceiros.
Decisão
Ao decidir, a maioria dos ministros se pronunciou pela constitucionalidade do artigo 71 e seu parágrafo único, e houve consenso no sentido de que o TST não poderá generalizar os casos e terá de investigar com mais rigor se a inadimplência tem como causa principal a falha ou falta de fiscalização pelo órgão público contratante.
O ministro Ayres Britto endossou parcialmente a decisão do Plenário. Ele lembrou que só há três formas constitucionais de contratar pessoal: por concurso, por nomeação para cargo em comissão e por contratação por tempo determinado, para suprir necessidade temporária.
Assim, segundo ele, a terceirização, embora amplamente praticada, não tem previsão constitucional. Por isso, no entender dele, nessa modalidade, havendo inadimplência de obrigações trabalhistas do contratado, o poder público tem de responsabilizar-se por elas.
Processos relacionados:
ADC 16
Notícias STF (www.stf.jus.br)
Quarta-feira, 24 de novembro de 2010
Parabéns pela excelente matéria.
ResponderExcluirA decisão do Supremo Tribunal Federal não deixa dúvidas de que a Administração Pública deve fiscalizar os contratos firmados com as empresas contratadas, e isto lamentavelmente não vem ocorrendo.
ORA MEUS CAROS COLEGAS DE PROFISSÃO, A JUSTIÇA DO TRABALHO JÁ TEM UMA PÉSSIMA REPUTAÇÃO. OS DESEMBARGADORES FEDERAIS FAZEM O QUE QUEREM, INDEPENDENTEMENTE DO TEXTO DA LEI. DE FATO, NEM O MICROSSISTEMA DOS JUIZADOS ESPECIAIS ESTADUAIS COMETE TANTO ABSURDOS QUANDO A JUSTIÇA OBREIRA.
ResponderExcluirESTE CASO É EMBLEMÁTICO, VEJAMOS: O LEGISLADOR EXPRESSAMENTE VEDOU A RESPONSABILIDADE ESTATAL PARA COM OS DÉBITOS TRABALHISTAS ORIUNDO DAS EMPRESAS QUE SE VALEM DO REGULAR PROCESSO LICITATÓRIO. (VIDE A LETRA DO ART.71 §1º DA LEI 8.666) OCORRE QUE LAMENTAVELMENTE NAS AÇÕES TRABALHSITAS ESTE DISPOSITIVO É AFASTADO E TODAS AS VEZES QUE O ENTE PÚBLICO INTEGRA A LIDE E A EMPRESA CONTRATADA É CONDENADA, A JUSTIÇA OBREIRA CONDENA SUBSIDIARIAMENTE O ESTADO. MAS QUAL SERIA O SUBSTRATO LEGAL PARA ISSO? CLT! OU SEJA, AO QUE PARECE SOMENTE NA JUSTIÇA OBREIRA A REGRA ESPECIAL (8.666) NÃO AFASTA A REGRA GERAL (CLT) DESDOBRADA PELA DA SÚMULA 331 TST.
SENHORES, A NORMA DA LEI 8.666 TEM VÁRIAS RAZÕES DE SER, UMA DELAS É EVITAR QUE A EMPRESA GANHE O CERTAME LIOCITATÓRIO ABAIXANDO O VALOR DA PROPOSTA NA MEDIDA EM QUE SE SABE QUE EVETUAL DÉBITO TRABALHSITA DOO SEUS EMPREGADOS PODERÁ SER ADIMPLIDO (SUBSIDIARIAMENTE) PELO ENTE PÚBLICO, ASSIM, DEPOIS DE QUITADO PELO ENTE PÚBLICO, A MESMA EMPRESA PODERÁ NOVAMENTE SE HABILITAR EM OUTRO PROCESSO LICITATÓRIO...
VEJAM O ABSURDO: FOI NECESSÁRIA UMA ADC PARA QUE OS MINISTROS E DESEMBARGADORES PONDERASSEM MELHOR ACERCA DE UM ASSUNTO QUE VIROU PIADA, PURA BATENÇÃO DE CARIMBO EM DESFAVOR DO ESTADO.
O MAIS LAMENTÁVEL É QUE TODA A COLETIVIDADE PERDE COM DECISÕES COMO ESTA, TROCANDO EM MIÚDOS, ESTE (DES)ENTENDIMENTO JURISPRUDENCIAL ESTÁ COMPELINDO O ESTADO A PAGAR A CONTA DO EMPRESÁRIO MAU PAGADOR.
POR ESTA E POR OUTRAS, NÃO HÁ DÚVIDAS: TODA E QUALQUER CONDENAÇÃO DO ESTADO NOS CASOS ESPECIFICADOS PELO §1º DO 71 DA LEI FEDERAL 8.666 É INEXORAVELEMNTE CONTRA LEGEM.
Caro amigo da mensagem anterior:
ResponderExcluirSeu discurso é coerente e bem informado com a tese de quem defende o artigo 71 da Lei 8666.
Ocorre que, com seu posicionamento pela ausência de responsablidade do Estado quando "terceiriza" serviços, duas coisas reprováveis vão perpetuar:
1) O mau administrador, que não se preocupa em fiscalizar o contrato de prestação de serviços do ente púclico com a empresa particular e não está nem aí para os trabalhadores terceirizados. Se a terceirizada não está quitando sequer salários dos trabalhadores, o poder público não tem nada haver com isso, certo?
Esquece os princípios fundamentais dos artigos 1º e 3º da constituição, que orientam o Estado a zelar pela proteção ao trabalho.
2)Com o entendimento da ADC 16, ficou tudo muito lindo! O empresário particular não paga, a administração pública também não; ambos continuam contratando e "licitando" para obter lucro para a empresa e para a "coletividade", e, o trabalhador, fica sem o seu sustento.
Não quero criar neste espaço uma narrativa dramática. Mas a realidade dos terceirizados, inclusive por culpa direta da administração, é outra e distante do discurso meramente formal da legalidade do artigo 71 da Lei 8666.
Sem contar ainda, que a´interpretação fria da letra da Lei é a mais pobre como meio de hermenêutica.
Como dizia Miguel Reale, um dos maiores juristes do século passado e criador do novo código civil, entre o caso concreto e a lei, deve existir um VALOR FUNDANTE, um princípio maior.
Há diferenças entre significado e significação:
Significado = intrepretação da letra da Lei
Significação = interpretação da letra da lei sobre o fio condutor do princípio que a orienta;
Sugiro este link para conhecer melhor a realidade dos "terceirizados" pela administração pública, inclusive no âmbito de uma das maiores instituições públicas do país:
http://www.diariotrabalhista.com/2011/04/carta-aberta-de-jorge-luiz-souto-maior.html
Faço minhas as plasvras de Christian Thelmo, com um acréscimo: Cada vez mais o STF se torna um tribunal desnecessário, porque atrasado. O TST e os TRT(s) estão muito mais perto da ralidade dos trbalhadores do que o STF, encrustado na pompa de seus gabinetes. Cadê as Centrais Sindicais que não pressionam o STF para mudar essa situação de prejuízo real aos trabalhadores? Não vai demorar, revogam a Lei
ResponderExcluirAurea. Era só o que faltava......