Comentário
do Blog: Olá amigos
leitores, assinantes / subscritores da Newsletter (serviço gratuito), “leitores
ilustres” aí do canto direito do Blog, seguidores do nosso Twitter oficial
(@D_Trabalhista) e parceiros.
Hoje o Blog volta a
publicar na Seção “ Artigos ”, na qual este
Blogueiro divide algumas reflexões sobre a evolução das relações trabalhistas
ou alguns de seus estudos no Direito do Trabalho.
O ponto de partida da reflexão de hoje é um julgamento de
relatoria do Ministro do TST Maurício Godinho Delgado (como já de costume neste
Blog), este quem, além de célebre magistrado é um dos melhores doutrinadores da área
trabalhista na atualidade, e sem dúvida aplica à ciência do direito do
trabalho a força irradiante dos postulados constitucionais.
Um caso de Terceirização Ilícita com
Ente Estatal e Vedação à prática discriminatória no núcleo da relação jurídica
pactuada
Como o leitor poderá constatar na notícia de julgamento
adiante transcrita, o TST viu-se obrigado a apreciar um típico caso de
terceirização ilícita de uma entidade estatal na qual um empregado de uma
empresa terceirizada foi contratado para exercer atividades típicas da
categoria dos bancários junto a um Banco Estatal.
O caso concreto posto em julgamento desafiou a sensibilidade
do julgador, à medida que não se pode corrigir a ilicitude mediante uma simples
fixação do vínculo empregatício diretamente com a entidade estatal (Banco).
Isso tudo, tendo em vista a expressa vedação constitucional que exige a prévia
aprovação em concurso público.
Neste imbróglio, além daquela narrada na notícia abaixo, a
solução adequada pode ser encontrada na obra doutrinária do próprio relator em
questão (Curso de Direito do Trabalho, 6ª Edição, 2007, página 807):
“Assegurando-se ao trabalhador
terceirizado todas as verbas trabalhistas legais e normativas aplicáveis ao
empregado estatal direto que cumpria a mesma função na entidade estatal
tomadora de serviços. Ou todas as verbas legais e normativas próprias à função
específica exercida pelo trabalhador terceirizado junto à entidade estatal
beneficiada pelo trabalho. Verbas trabalhistas, e apenas estas – sem
retificação, portanto, de CTPS quanto à entidade empregadora formal, já que
esse tópico é objeto de expressa vedação da Carta Magna.”
Perfeito!
Observe bem que a visão do ilustre doutrinador não nega
vigência a um dos princípios constitucionais mais democráticos (princípio
antidiscriminatório), ao passo que também não ousa afrontar a também
democrática e republicana regra do art. 37, caput, II e §2º da mesma CF.
O que vemos aqui, no julgamento em análise, é a perfeita
harmonia entre princípios constitucionais sensíveis que numa primeira leitura
pareciam colidir entre si.
A questão do “correspondente bancário”
no cerne da terceirização lícita – outra prática discriminatória que viola
regras de proteção ao salário
Aproveitando o ensejo deste interessante debate acerca das
terceirizações nas atividades bancárias, este Blogueiro entende por interessante
(e necessário!) uma reflexão sobre a figura do trabalhador que se ativa no
posto de “correspondente bancário”.
Para que o amigo leitor identifique melhor a figura do
correspondente bancário, vou ilustrar: sabe aquele trabalhador que atua em caixa exclusivo para
pagamento de contas de consumo e serviços, bem como operações financeiras
diversas (distintas do tradicional caixa de pagamento de compras), que existe no supermercado que
você frequenta? E aquele caixa exclusivo da lotérica que somente faz operações
de benefícios da Caixa Econômica (PIS, Seguro Desemprego, etc..) e saque do
Correntista da Caixa? E aquele caixa do hipermercado que somente aprova
créditos, financia débitos, aceita cobrança de outros bancos? Lembra destes?
Pois é, estes são os empregados que assumem o posto na
função de “correspondentes bancários”, uma atividade “delegada” pelos bancos, no entanto, são contratados e geralmente
são vinculados aos direitos coletivos apenas destas lotéricas, correios e
estabelecimentos comerciais.
Semana passada, este escriba viu o chefe do Departamento de
Normas do Sistema Financeiro do BC descrever a estreita vinculação jurídica do correspondente
bancário com as instituições financeiras (link: http://agenciabrasil.ebc.com.br/noticia/2011-08-16/correspondente-bancario-fomenta-transparencia-e-concorrencia-segundo-bc
).
Vale transcrever um trecho:
Vale transcrever um trecho:
“...“tarefas tipicamente operacionais, vinculadas a atividades privativas das
instituições financeiras. Além disso, os correspondentes são só intermediários entre bancos e clientes,
não assumindo nenhum risco nas operações, e “a qualidade dos serviços prestados é de inteira responsabilidade da
empresa contratante....” (grifei!)
Percebeu?
É bom dizer também que não se cogita neste espaço satanizar
esta prática "delegada" pelas instituições financeiras, pois foi criada pelo
sistema financeiro nacional (SFN) com fins altruístas e propósito de facilitar
o acesso do brasileiro a serviços bancários. De se ressaltar que os
correspondentes foram criados como mecanismo de inclusão para o atendimento dos
clientes por meio de estabelecimentos em locais onde não existe assistência
bancária.
E trata-se de terceirização lícita da atividade bancária,
prevista em nosso ordenamento. O Banco Central (BC) permite a
contratação dos correspondentes integrantes ou não do Sistema Financeiro
Nacional (SFN) – como estabelecimentos do comércio em geral – pelas
instituições financeiras.
O problema - como já sugeri - é que os correspondentes
são tratados como comerciários e com jornadas de oito horas, sábado e domingo e
salário mínimo. Estas medidas em vez de estimular o incremento, precariza o sistema
de proteção aos direitos sociais do trabalhador, notadamente o de proteção ao salário e da vedação de prática discriminatória.
Pior do que isso, os bancos tendem a perder interesse de
abrir novas agências, já que um correspondente tem menos exigências legais e
trabalhistas e pode atender à maior parte da demanda. Dilui, desnatura de forma
perversa a unidade coletiva da categoria dos bancários e suas conquistas
históricas, inclusive contra as condições penosas de trabalho. Não é por acaso
que a jornada do bancário é de apenas 6h00 diárias.
Em conclusão, é inegável que esta forma terceirizante
(embora “lícita”) tende a criar um padrão de contratação de força de trabalho
sumamente inferior àquele que caracteriza o trabalhador submetido ao contrato
empregatício clássico.
Talvez seria desnecessário reiterar, mas o artigo 7, XXXII
da Carta de 1988, reelaborou o preceito antidiscriminatório existe no nosso
ordenamento: “proibição de distinção entre trabalho
manual, técnico e intelectual ou entre os profissionais respectivos”.
É uma regra enfática e precisa, sendo que em virtude deste
parâmetro constitucional é devido, nesta situação, o salário equitativo, hábil
a assegurar correspondência não-discriminatória entre os respectivos
profissionais (bancário e correspondente bancário).
Veja agora, a notícia de julgado que motivou o artigo de
hoje:
Empregada
terceirizada receberá salário equivalente a bancário do Banco do Brasil
15/08/2011
Em
decisão unânime, a Sexta Turma do Tribunal Superior do Trabalho (TST) garantiu
a uma trabalhadora terceirizada o direito de receber o mesmo salário pago aos
bancários do Banco do Brasil que exercem cargo ou função similar ao dela, além
dos benefícios próprios da categoria previstos em normas coletivas. Com
fundamento em voto do ministro Maurício Godinho Delgado, o colegiado concluiu
que a empregada desempenhava atividades típicas de bancário, apesar de ter sido
contratada por outra empresa.
O
relator aplicou ao caso a Orientação Jurisprudencial nº 383 da Seção I
Especializada em Dissídios Individuais do Tribunal, segundo a qual a
contratação irregular de trabalhador, por meio de outra empresa, não gera
vínculo de emprego com a Administração Pública, mas, pelo princípio da
isonomia, garante o direito dos empregados terceirizados às mesmas verbas
trabalhistas legais e normativas asseguradas àqueles contratados pelo tomador
dos serviços, desde que presente a igualdade de funções.
O
Tribunal Regional do Trabalho da 10ª Região (DF/TO) havia reformado, em parte,
a sentença de origem para declarar nulo o contrato de trabalho e conceder à
empregada apenas saldo de salário, depósitos do FGTS e horas extras. O TRT
observou que nem se tratava de terceirização ilícita de mão de obra, e sim de
“quarteirização”, pois a empresa Cobra Tecnologia fora contratada para realizar
o processamento dos envelopes dos caixas eletrônicos para o banco e valeu-se de
pessoal fornecido pelo Centro Educacional de Tecnologia em Administração
(CETEAD) – entre eles, a autora da ação.
De
acordo com o Regional, a empregada prestava serviços na Tesouraria do
Edifício-sede I do Banco do Brasil, em Brasília, desempenhando tarefas próprias
de bancário, com subordinação direta à administração do banco, ainda que o
empregador formal fosse o CETEAD. De qualquer modo, como houve intermediação de
mão de obra sem prévia realização de concurso público, conforme exige a
Constituição Federal, e a ex-empregada se beneficiara dessa situação ilícita, o
TRT restringiu os créditos salariais, tendo em vista a nulidade do contrato.
Entretanto,
ao examinar o recurso de revista da trabalhadora no TST, o ministro Maurício
Godinho destacou que os serviços de processamento de envelopes dos caixas
eletrônicos revela o desempenho de tarefas típicas dos empregados bancários,
pois serviços de processamento desenvolvidos na retaguarda da agência são
essenciais ao empreendimento do banco. Assim, a empregada tinha razão em
pleitear os mesmos salários e benefícios pagos à categoria, considerando o
princípio da isonomia.
Para
o relator, na medida em que a empregada realizava atividades comuns àquelas
desempenhadas pelos bancários, deve ter os mesmos direitos assegurados a essa
categoria profissional, do contrário haveria desprestígio do trabalhador e
premiação da discriminação. Ele também reconhece que a terceirização ilícita
(ou, como na hipótese, a “quarteirização”) não produz vínculo de emprego com o
Banco do Brasil, que é empresa pública, porém, nos termos da Súmula nº 331,
item V, do TST, há a responsabilização subsidiária do tomador dos serviços
pelos créditos trabalhistas devidos ao empregado.
No
caso analisado, como desde a sentença de primeiro grau houve a condenação pela
responsabilização solidária das empresas envolvidas, sem nenhuma contestação, o
relator a manteve. Por fim, o ministro Godinho deferiu o pagamento de
diferenças salariais, considerada a equivalência salarial entre a remuneração
recebida pela empregada e pelos bancários do Banco do Brasil com cargo ou
função similar. O relator ainda estendeu à trabalhadora as vantagens previstas
em acordos coletivos para a categoria dos bancários pedidas na ação.
Fonte:
Assessoria de Comunicação do TST – www.tst.jus.br
Processo:
(RR-9740-43.2008.5.10.0019)
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